quinta-feira, 30 de maio de 2013

Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial - Cap 4

NOVAIS, Fernando A. Portugal e Brasil na crise do antigo sistema colonial. 6ª ed. Editora Hucitec, São Paulo, 1995 Cap 4 b Formação e c Resultados

Portugal não ficou apenas nos estudos ilustrados e as análises interpretaticas dos problemas da época, a consciência da situação levou à tomada de posições e a formação de uma política colonial.
“Sendo pelo comércio que se estabelece o vínculo metrópole-colônia, isto marcava o parâmetro do movimento reformista” (p. 240).
Análise por meio de legislações da época.
a) Diretrizes da Política comercial
 Continuidade com o período anterior: combate ao contrabando e a preservação do exclusivo (ou exclusivismo). Peça fundamental desse combate é o alvará de 05/01/1785 que reafirmava a competência do vice-rei, governadores e juízes das capitanias de perseguir e prendes os contrabandistas criminosos – um contragolpe do “avanço da penetração mercantil fora das traves do sistema” (242). O contrabando se tornava recorrente tendo em vista a Revolução Industrial e o impacto dele no comércio industrial. A preocupação era que a competição comercial da colonização mercantilista e o contrabando poderia levar, em última instância, a uma perda da colônia portuguesa para outra metrópole europeia.  Além disso, a Revolução Industrial dá à Inglaterra a vantagem de barateamento de seus produtos, daí o problema de ocorrer o apoio dos colonos às atividades fora do pacto com Portugal e a autonomização das colônias. Este problema tem, portanto, duas faces: quebra do pacto com a metrópole e um novo pacto com outra metrópole mantendo assim o sistema colonial e também a “dissolução do sistema, com a independência da colônia” (p. 243). Este último ponto poderia ser interessante à uma potência concorrente e com isso o contrabando adquire novas funções.
Medidas: proibição da entrada do vinagre estrangeiro que substituía o vinho portugês; impedimento de fitas, galões de seda e lã; reforçado medidas contra contrabando de tabaco e sabão; devassa-se a alfândega de Maranhão.
“O combate ao contrabando, que percorre todo o período, significava, de fato, a tentativa de manter o processo de mudanças exigidas pela situação de crise, dentro das fronteiras do sistema” (p. 243). É um processo de abertura, mas dentro do sistema, como define Novais. Um ponto que inicia essa abertura é a extinção das companhias de comércio e seus monopólios (e de monopsônio também?) da comercialização de produtos com a colônia.
“Estes privilégios exclusivos são sem dúvida prisões da liberdade do comércio; e sendo evidentemente a maior liberdade possível do comércio o único meio de conciliar o interesse particular dos comerciantes com o interesse comum dos proprietários e do Estado, é certo que os privilégios exclusivos devem necessariamente produzir um ruinoso conflito entre o interesse particular  e o geral, que em lugar de se auxiliarem mutuamente, tarde ou cedo se hão de destruir” (NOVAIS: 1995, p. 246)
Fonte: Memórias sobre o estado da agricultura e do comércio do Alto Douro (1782), in Memorias Economicas da Academia Real das Sciencias de Lisboa, vol III, pp. 81-82.
“ainda as que parecem justas e necessárias, não convém; porque nunca cuidam mais que do seu próprio interesse, o que tem mostrado a experiência, não só em Portugal, mas em todos os estados da Europa>>. Pois <<o nervo do comércio é a liberdade; as companhias privam-no, absorvendo a sí  todo, e fazendo um rigoroso monopólio.>> Enfim: <<não servem de utilidade senão aos poucos que as compõem à custa da nação inteira>>.” (NOVAIS: 1995, p. 246)
Fonte: Discurso contra as companhias privadas
Princípios de economia política e dessa nova fase do pensamento também são percebidos nas medidas contra o estanco do sal e do contrato da pesca das baleias em Portugal. Autores da Academia Real de Sciencias de Lisboa mostravam no Memórias Econômicas que a concorrência traria a perfeição à pesca de baleias, por exemplo. Com maior empresários no setor, o preço reduziria e isso propiciaria a “cópia e barateza das demais [mercadorias]” (p. 247). 
Além disso, medidas contra o estanco do sal, em última instância, também beneficiavam o comércio inter-colonial, uma vez que estimulava a indústria do ferro na colônia com isenção de tributos sobre o metal e também permitia a entrada de maior sal no Brasil para abastecer a indústria de charque no Rio Grande do Sul. Permitiu-se o comércio de produtos feitos em outros continentes, exemplo disso é a proibição da taxação sobre o licor e o tabaco brasileiros, além da isenção de direitos de exportação de escravos de Angola para o Pará.
Abandono da política de companhias de comércio, abolição dos estancos e a abertura para o comércio inter-colonial são pontos que caracterizam a política colonial deste novo mercantilismo ilustrado. “Era assumir uma posição intermediária entre o mercantilismo tradicional e as novas teorias econômicas” (NOVAIS: 1995, p. 250). Esse novo posicionamento de Portugal é interpretado por Novais como um abrandamento em face da crise. É uma reforma que privilegia aumento dos negócios e maiores vantagens com o incentivo das exportações de produtos coloniais para outras nações, ou seja, a busca de novos mercados segundo Azeredo Coutinho. (vide gráfico X)

Crítica de um autor não identificado por Novais mostra que a renda do comércio ficava nas mãos de “poucos e grossos capitalistas”. Lucros obtidos às custas do Estado não tinham como fim os cofres públicos. Isso impediu a “formação de uma autêntica mentalidade empresarial; o resultado era a fraqueza para competir externamente” (p. 253) – o que mostra a necessidade de reformas internas na metrópole, porém, “no conjunto da burguesia”, predominava “o setor acomodado ao ganho de monopólio” dessa classe ligada ao comércio ultramarino que não queria arriscar seus ganhos em outras atividades cujos lucros eram-lhes incertos.
b) Incentivo à produção com abertura de novas frentes de mercado, além dos gêneros tradicionais aos quais estava habituada as colônias. Para isso, uma nova política tarifária se ajustava à necessidade de dinamização e diversificação da produção colonial, com isenções daqueles produtos exportados para a metrópole, por exemplo. “A política de incentivo se desenvolvia ao lado de todo um movimento de estudos dos problemas técnicos da produção colonial e metropolitana” (259). As preocupações com a técnica incluíam a utilizada na produção do açúcar, na extração mineral e também com o uso da mão-de-obra escrava.
“No quadro dessa política que tentava por em prática a visão dos teóricos, que como vimos se empenhavam em superar oposições reais e concretas, harmonizando polos que o movimento de crise tendia a distanciar, ficavam ainda bafejados por isenções tarifárias os produtos que servissem de matéria-prima às manufaturas metropolitanas. Efetivamente muitos produtos brasileiros constituíam matéria de base às manufaturas do reino e a legislação do período procura abrir a entrada para essas matérias-primas” (p. 268)
c) teares e forjas. O mesmo ato de 5/1/1785 que combatia o contrabando também proibia as manufaturas nas colônias. O motivo era o “grave prejuízo da cultura e da lavoura e da exploração de terras minerais”. As fábricas ocupariam braços que poderiam ser usados em novas descobertas no território brasileiro. Foi observado pela coroa uma diminuição no quinto provindo da mineração e também uma diminuição, no Brasil, das importações de tecidos vindos de Portugal, por conta do contrabando e de uma suposta instalação de manufaturas em terras coloniais. Isso geraria uma quebra do oligopsônio e também tinha uma justificativa fisiocrata que pregava que a verdadeira riqueza vinha apenas da terra.
Apesar de proibir a manufatura de tecidos, incentivou-se a de ferro. “Os estudiosos da mineração, no quadro do movimento ilustrado, tinham insistido em apontar o atraso da técnica como um dos fatores do declínio do ouro, e a escassez do ferro era um dos motivos de travação do desenvolvimento de lavrar as minas” (p. 281) Esse problema com o ferro era apontado como um dos limitantes do progresso da colônia.

3. Resultados
Era para o entrelaçamento e interdependência que se voltavam os objetivos da política econômica em Portugal.
a) êxitos:
I. Conjuntura de prosperidade; relações mais estáveis entre Portugal e outras nações que entre Portugal e colônias – Portugal se fortalece no comércio exterior.
II. Portugal teve déficit com as colônias (importou mais);
III. Portugal teve superávit com as demais nações – no período pombalino a situação era deficitária;
IV. Brasil era responsável por 83,7% dos produtos importados por Portugal entre 1796 e 1807 e o Brasil recebeu 78,4% das exportações de Portugal;
V. Comércio superavitário entre Portugal e Inglaterra; Inglaterra e Brasil tinham posições importante no comércio de Portugal;
VI) Era graças ao Brasil que Portugal fazia seu comércio superavitário com o exterior enquanto o colonial era deficitário;
b) frustrações.
Surto manufatureiro na metrópole – “Desenvolver a metrópole significava promover uma sólida base de produção industrial para reduzir a defasagem que a apartava dos centros mais desenvolvidos da Europa” (p. 295). O progresso manufatureiro até conseguiu êxito vide as exportações de manufaturados para as colônias ser crescente em um certo período (gráfico 29)
Declínio das exportações de manufaturados para a colônia = ponto de inflexão do surto industrialista de Portugal.
“O principal fator de recuo das manufaturas portuguesas no Brasil foi a pressão irresistível da indústria inglesa. (...) apesar do esforço, a política de incentivo não conseguiu conter a penetração do industrialismo nascente e consolidar as suas conquistas na recuperação da defasagem econômica” (p. 297)
A revolução liberal enfrenta o problema do arcaísmo português – reformas sociais tímidas na metrópole tornou-a vulnerável na onda revolucionária.

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