quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Resenha: FILGUEIRAS, Luiz. História do Plano Real. (Cap. 3)

FILGUEIRAS, Luiz. História do Plano Real. 3a ed. São Paulo: Boitempo Editorial, 2007. Cap. 3.

A matriz da elaboração do Plano Real se constituiu de duas vertentes: o "Consenso de Washington" e a experiência do Plano Cruzado. O primeiro como um guia para novos caminhos para a América Latina, com o objetivo de estabilização e de desenvolvimento impulsionados pelo liberalismo, pela globalização e pela reestruturação produtiva. Já o segundo indicando os caminhos que não deveriam ser conduzidos após as discussões sobre a natureza da inflação inercial, a moeda indexada e o choque heterodoxo.
O Consenso de Washington, elaborado em novembro de 1989 numa reunião entre os Estados Unidos, o FMI, o BIRD, o BID e economistas acadêmicos latino-americanos, discutiu as reformas liberais que estavam em andamento no centro e no sul do continente americano e também discutiu as possibilidades de coordenação das ações desses países. No campo fiscal, o Consenso indicou contenção dos gastos públicos, "que deveriam se restringir à manutenção de um 'Estado Mínimo', e a realização de uma reforma tributária - que privilegiasse, sobretudo, a ampliação da base de incidência dos tributos e não o seu aumento e que tivesse menos progressividade do imposto de renda e maior contribuição dos impostos indiretos" (Filgueiras: 2007, p. 95). Nas políticas de estabilização deveriam ser adotados: um regime cambial centrado na dolarização direta ou indireta da economia com sobrevalorização da moeda nacional e uma política monetária passiva. Além disso, "seria imprescindível a liberalização comercial e financeira, que, segundo o 'Consenso', atrairia capitais externos e possibilitaria a inserção competitiva dos países da América Latina na economia mundial" (Filgueiras: 2007, p. 96).
Os investimentos estrangeiros diretos deveriam ter tratamento igual ao capital nacional por serem considerados como instrumentos de complementação da poupança nacional e não deveriam ter restrições na economia, como na área de recursos naturais. "No entanto, os governos não deveriam atrair capitais estrangeiros para produção de manufaturas para exportação através de incentivos ficais ou creditícios" (ibid.) E neste pacote ainda entraram as privatizações e desregulações das atividades econômicas como medidas, principalmente no caso da primeira, para abater as dívidas dos governos.
Quatro anos após a primeira reunião, houve um novo encontro para avaliar o porquê de os capitais internacionais estavam se voltando para a América Latina num cenário de grande liquidez nos mercados financeiros e esses países deveriam atrair esses recursos por meio de implementação de planos de estabilização que efetivariam as privatizações, abririam os mercados financeiros e de produto e estabilizariam o câmbio.  Essa receita prometia inflação baixa, crescimento e inserção na economia mundial globalizada. Contudo a implementação dessa ordem pode gerar problemas sistêmicos nas economias dada a lógica de funcionamento do mercado financeiro internacional e sua característica de ganhos financeiros de curto prazo. A adoção de políticas macroeconômicas não garante a sustentabilidade do fluxo de capitais.
Na segunda matriz do Plano Real, a experiência com a moeda indexada no Plano Cruzado rendeu a ideia de que a desindexação não poderia ser feita com congelamento de preços por conta de seus efeitos controversos nos preços relativos. A Unidade Real de Valor (URV) no Plano teve a mesma função da moeda indexada do Cruzado, com planos para extinguir a indexação de forma abrupta no futuro. Contudo, a URV funcionou apenas como embrião da nova moeda, tendo função de moeda de conta e não de pagamento. Outros aprendizados com o Plano Cruzado foram: a) a inflação não é apenas inercial e um de seus componentes era a fragilidade financeira do Estado; b) mudar abruptamente para uma nova moeda traz as pressões inflacionárias da velha moeda; c) seria necessário uma política monetária  com taxas de juros mais altas para barrar o aumento do consumo com a queda da inflação; d) salário médio da economia pode crescer e pressionar o consumo.
Entre o anúncio em 1993 e a implementação da nova moeda, em 1994, o Plano Real teve três partes: ajuste fiscal, criação da URV e a instituição da nova moeda.  Na primeira parte, o governo de Itamar Franco lançou medidas para reorganizar o setor público incluindo redução e maior eficiência dos gastos; recuperação da receita tributária; fim da inadimplência de Estados e Municípios com a União; controle dos bancos estaduais; saneamento dos bancos federais; aperfeiçoamento e ampliação do programa de privatização. Essas medidas respondem ao problema de desequilíbrio do orçamentário do Estado, em especial a fragilidade de financiamento. De forma geral essa primeira etapa foi para construir a chamada "âncora fiscal" dos preços e garantir aos agentes econômicos que o governo só gastaria o que arrecadassem sem emitir títulos para cobrir déficits. Contudo, as tentativas de ajustes fiscais fracassaram por conta das elevadas taxas de juros.
Na segunda fase, a URV era vista, no início, como mais um índice de inflação, um superindexador que usava três outros índices (IGP-M, IPCA e IPC) para definir as variações do cruzeiro real. A escolha destes índices se deu por conta da aproximação de sua média com o câmbio e o  objetivo de amarrar a URV ao dólar, preparando a "âncora cambial" da nova moeda. A unidade foi importante por não permitir uma mudança abrupta de moeda e começou a passagem de todos os preços do Cruzeiro Real para a URV de modo espontâneo através da fixação imediata dos preços, tarifas e contratos públicos. Dessa forma se impedia que a inflação da moeda antiga contaminasse a nova, ou seja, "seu papel essencial foi o de apagar a memória do passado, eliminando, desse modo, o componente inercial da inflação" (Filgueiras: 2007, p. 105). Por conta da experiência passada de congelamento de preços e do processo de passagem dos preços e contratos públicos para a URV, bem como da passagem compulsória, os preços se aceleraram antes da passagem para a nova moeda, mas nos três meses seguintes houveram pressões para novos ajustes e revisões para baixo desses.
A passagem para a nova moeda, em 1º de julho de 1994, se deu trazendo consigo a "âncora cambial". A taxa de câmbio ficou definida em US$ 1 = R$ 1 e contava com as reservas de dólares feitas desde 1993. Esperava-se emitir reais trimestralmente e esse montante teria correspondência com os dólares depositados no Banco Central e reafirmava-se, mais uma vez, o compromisso de não realizar novas emissões para cobrir déficits primários. Contudo, esses tetos de emissão monetária foram abandonados quando da implementação da moeda, pois houve queda abrupta da inflação apesar do aumento das taxas de juros. Fica evidente também a dolarização da economia brasileira nessa etapa, pois o governo não garantiu a conversibilidade entre as duas moedas. A não intervenção do Banco Central no mercado de câmbio implicou numa deflação dos bens e serviços associados ao dólar, o que contribuiu para o aumento das importações e, devido às altas taxas de juros, um grande entrada de fluxos de capitais de curto prazo e elevado nível de reservas cambiais.




Resenha: CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. (cap 7)

CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. São Paulo: UNESP/IE-UNICAMP, Cap. 7, 2002.

Carneiro admite a globalização como a resultante da interação da liberalização financeira nas economias domésticas com a crescente mobilidade de capitais no plano internacional. Neste cenário a globalização produtiva adquire um papel subordinado e a financeira predominante. O principal efeito da financeirização sobre a dinâmica capitalista é a mudança no comportamento dos agentes econômicos. "A questão essencial é que o aprofundamento das finanças de mercado modifica o comportamento dos vários tipos de agentes, cuja lógica de investimento se transforma e adquire um caráter especulativo" (Carneiro: 2002, p. 228).
A economia internacional nessa era de globalização é marcada pela livre mobilidade de capitais, regime de taxas de câmbio flutuantes e autonomia nas políticas econômicas domésticas. Além disso, o sistema monetário-financeiro é, ainda, hierarquizado, tendo como núcleo o dólar e a partir dele se formam as demais taxas de juros, dada a existência de livre mobilidade de capitais. Há, neste sistema, três categorias de moedas: a moeda reserva (dólar), moeda conversível (dos países centrais) e as moedas não conversíveis (países periféricos). As taxas de juros no núcleo do sistema são as menores por conta da grande segurança que ela transmite aos seus detentores, além de ser a mais forte. Conforme se afasta do núcleo, as taxas de juros vão aumentando, dada a segurança menor e as exigências dos proprietários dos capitais para investir nessas moedas. Essa lógica torna desfavorável a formação da taxa de juros dos países periféricos. Avaliados a partir de agências de classificação de risco e dentro do sistema com livre mobilidade de capitais, países periféricos não podem baixar suas taxas além das taxas de juros dos países centrais por que podem provocar fuga de capitais e também podem perder as entradas de recursos na economia. Sendo assim, "a autonomia da política econômica doméstica, entendida como a capacidade de determinar as taxas de juros, é restrita quando comparada à dos países do centro do sistema" (Carneiro: 2002, p. 232)
Quebrar essa lógica só é possível com as moedas conversíveis em países onde há um fluxo de capitais permanente. Taxas de juros abaixo do mercado implica em desvalorização do câmbio por conta das saídas de capitais. Contudo o câmbio tem um piso e a partir dele se torna interessante o retorno destes capitais. Nos casos de moedas não conversíveis, na margem desse sistema, a alternativa não existe por conta da inexistência do piso da taxa de câmbio o que provoca uma desvalorização do câmbio sem limites e os capitais não retornam para essas economias.
Uma característica do sistema globalizado e aspecto crítico, segundo Carneiro, é o patamar elevado das taxas de juros. A explicação disso é que as taxas de juros é o produto de convenções e do grau de incerteza que agentes atribuem a essas convenções. Níveis elevados de incerteza representam a preferências dos agentes pela liquidez e, portanto, um prêmio ainda maior deve ser pago para eles abrirem mão dela. O autor aponta como fatores que influenciam a preferência pela liquidez: o predomínio das finanças de mercado e os fundamentos do sistema monetário internacional. Este é explicado por conta da livre mobilidade de capitais e da taxa de câmbio flutuante. Por conta dos riscos diferentes dos países e da flutuação da taxa de câmbio, o nível de incerteza aumenta.
Outra característica ou implicação da globalização é o fato de as transações brutas adquirirem um peso desproporcional no período. Isso se dá por conta do descolamento dos fluxos de capitais dos fluxos reais, de comércio e de investimento direto externo, mas também pelo fato de a globalização ser uma "via de mão dupla" na qual o recebimento e exportação de capitais são simultâneos e, mais uma vez, por conta do câmbio flexíveis e taxas de juros flutuantes. "Ao permitir ganhos de curto prazo na especulação com moedas e taxas de juros, esse sistema exacerbou o peso dos fluxos de capitais igualmente especulativos de curto prazo" (Carneiro: 2002, p. 237). A partir de 1985 aumentam os fluxos de capitais com foco nos investimentos diretor e em portfólio, este último com maior importância na escala hierárquica proposta por Turner, seguido pelo IDE, empréstimos bancários e setor público. Ou seja, há uma predominância de fluxos privados acima do bancário. O destaque para fluxos para portfólios é explicado pela possibilidade de maior volatilidade dos fluxos oriundos de investidos institucionais após os anos 1980. A composição desses portfólios ficaria mais suscetível aos movimentos do câmbio e do juros, o que também explica as crises localizadas na década de 1990.
Na década de 1980 ocorre uma retomada dos fluxos de IDE, explicado pela cadeia de valor agregado distribuída por diversos países e empresas e a diversidade geográfica dos mercados de destino da produção, como aborda Dunning (1997). Esses IDEs ainda assumem a forma de fusões e aquisições e alianças estratégicas em detrimento da forma greenfield, ou abertura de novas empresas.
Nos anos 1990 as finanças de mercado se aprofundam ainda mais, além da continuidade do crescimento de investidores institucionais e a diversificação de seus portfólios. Nesta década os países emergentes são reincorporados nos fluxos de capitais com predominância dos fluxos privados. Os fatores de atração da periferia  são as reorientações das políticas econômicas de longo e de curto prazo. As políticas econômicas caminham para a liberalização dessas economias e, além disso, os altos patamares de juros e, consequentemente os elevados rendimentos permanecem. A liberalização desses mercados é considerada uma mudança essencial no cenário econômico e outra característica dessa época é que mesmo que "embora as condições macroeconômicas e de juros tenham sido inicialmente relevantes como fatores de atração, o processo de fusões e aquisições, incluindo a privatização, adquire subsequentemente maior peso" (Carneiro:  2002, p. 246).
Na continuação do capítulo o autor também avalia as diferenças nas inserções das periferias latino americana e asiáticas. De seus argumentos, aquele que mais se ressalta é o fato de as articulações com as economias desenvolvidas. Na Ásia, Japão teve um papel complementar nas relações com os Tigres Asiáticos (Hong-Kong, Cingapura, Taiwan e Coreia do Sul) e com o Asean-4 (Indonésia, Malásia, Filipinas e Tailândia). Na América Latina, contudo, essa relação não seguiu a lógica da complementaridade, mas sim da competição.


Resenha: CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. (Cap. 6)

 CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. São Paulo: UNESP/IE-UNICAMP, Cap. 6, 2002.


O autor dedica o capítulo à análise da crise monetária e da hiperinflação brasileira na década de 1980. Começando pela discussão se houve ou não a hiperinflação, dadas as diferentes interpretações do conceito e da realidade brasileira na época, Carneiro apresenta visões de diferentes trabalhos sobre o tema para debate-lo. Se fosse levado a risca, a hiperinflação não teria ocorrido no Brasil na opinião de uns por conta da não existência de substituição monetária radical da moeda nacional. Em discordância desse ponto, Carneiro alega que a maioria dos autores defende a existência desse fenômeno inflacionário elevado por que houve na economia brasileira a moeda indexada o que na prática gerou uma substituição monetária. Essa prática representou de maneira indireta a dolarização de nossa economia, segundo ele.
Após introduzir a discussão, Carneiro divide a década de 1980 em dois períodos para sua análise. O primeiro, referente aos cinco primeiros anos, começa com o esforço de ajustamento externo para se obter superávits comerciais e enviar recursos para o exterior. Este período é marcado pela redução da periodicidade das minidesvalorizações até se chegar em desvalorizações diárias em 1985 dada a aceleração da inflação doméstica. Além da política cambial, a monetária se torna mais recessiva por conta do foco na redução da absorção doméstica e a transferência de recursos reais para o exterior. A questão principal por detrás da inflação era a evolução dos preços do câmbio e dos juros e o efeito que eles tinham nas expectativas dos agentes. Para proteger o capital, empresários flexibilizam suas margens de lucro e, segundo Almeida & Novais, citados por Carneiro, “foi o aumento das margens de lucro das grandes empresas que constituiu o fator predominante de aceleração da inflação durante o período” (2002, p. 2010). Portanto, é viável admitir que a recessão não foi eficaz contra a elevação dos preços já que as grandes empresas encontravam, além de seu poder de mercado, um coeficiente para importar reduzido na economia brasileira, o que diminuía a concorrência com os produtos externos e aumentava a liberdade na fixação dos preços.
A moeda indexada se apoiava na correção monetária. Por conta disso, os bancos encurtam o prazo das aplicações e aceitam depósitos remunerados com liquidez imediata. Para isso, reduzem os empréstimos, de liquidez menor, e eles foram sendo substituídos por títulos públicos. Para se adaptar, o Banco Central precisou emitir títulos com prazo mais curtos indexados à correção monetária. Todo esse mecanismo têm consequências. Para os bancos, há a perda de capacidade de criação de moeda bancária, ou seja, a supressão do multiplicador bancário. Para o público há uma perda da diferença entre poupança e moeda, dado esse encurtamento dos prazos. E para o Banco Central a perda da capacidade de fazer política monetária, ou seja, “a capacidade de alterar a taxa de juros básica do sistema ou o nível de reservas do sistema bancário, a sua disposição de conceder crédito e, a partir daí, via mecanismos de transmissão, a trajetória de variáveis reais” (Carneiro: 2002, p. 213). O BC não consegue mais alterar a liquidez do sistema por meio da venda de títulos.
Nesse cenário, o Plano Cruzado teve o fracasso que teve porque não foi capaz de assegurar a estabilidade de preços após o congelamento. A manutenção desse congelamento teve consequências na taxa real de câmbio, apreciando-a. Mas essa revalorização só seria sustentável se o Brasil conseguisse reduzir as transferências de recursos reais ao exterior por meio de novos financiamentos ou renegociação da dívida, mas o cenário ainda era restritivo internacionalmente. Contudo, como aponta o autor, a questão principal era como recuperar o nível de gastos e investimentos sem ampliar o endividamento público junto ao setor privado, mas essa questão não foi considerada.
Carneiro afirma que o Plano Cruzado “abriu caminho à crescente explicitação da hiperinflação” (2002, p. 214).  Segundo ele, os elementos para caracterizar a hiperinflação estavam na financeirização dos preços e na polarização da riqueza financeira nas quase-moedas ou na moeda indexada. O autor explica que a aceleração dos preços foi tão rápida que começou-se a usar as taxas de juros de curtíssimo prazo (overnight) como critério para reajuste dos preços. Este processos é o que Belluzzo & Almeida (1990) batizaram de “financeirização dos preços”. Esse ‘fenômeno’ a formação de preços perdeu as referências com o processo produtivo concreto, ou seja, com os custos.

Há uma tentativa de reverter a situação com o Plano Collor e sua reforma monetária. O bloqueio da poupança e dos ativos e as demais ações tomadas pelo governo para a instauração da nova moeda gerou uma avaliação positiva, de que ela foi competente em restaurar algumas das funções da moeda nacional, apesar de não conseguir erradicar o regime de alta inflação, mas conseguiu deter a hiperinflação. A raiz do sucesso no combate à hiperinflação está, segundo Carneiro, no sequestro  da liquidez e nos critérios de correção monetária dessa liquidez. Houve deságio de vários títulos públicos e privados. A consequência disso foi que todos os ativos reais e de risco sofreram desvalorização, ou seja, a reforma evitou a explosão de preços dos ativos reais.

Resenha: CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. (Cap 4)

CARNEIRO, R. Desenvolvimento em crise: a economia brasileira no último quarto do século XX. São Paulo: UNESP/IE-UNICAMP, Cap. 4, 2002.

A década de 1980, em relação aos anos anteriores, marca uma mudança no ciclo econômico e no dinamismo da moderna industrialização que vinha ocorrendo desde os anos 1930, e em particular a partir de 1950. São dois lados, separados em dois períodos diferentes: intenso crescimento no período do “Milagre Econômico”, de 1970 a 1973, e um período de desaceleração entre 1974 e 1980 que segue com taxas de crescimento, mas apenas próximas ao crescimento da população alternando com momentos de breves recessões. No que se refere ao investimento, a década é marcada por profunda incerteza e ausência de um padrão de crescimento sustentado. “A drástica redução do crescimento, a estagnação do produto per capta, a regressão do investimento e a transferência de recursos reais ao exterior são, assim, os pontos de destaque numa caracterização da década de 1980” (Carneiro: 2002, p. 140). De todos os pontos, o autor apresenta as relações e o saldo com o exterior um fator primordial por criar constrangimento ao desenvolvimento da economia nacional dada a transferência de recursos reais para servir a dívida externa.
Há três interpretações distintas para o desempenho econômico desfavorável da década de 1980. O primeiro aponta a incompatibilidade entre o crescimento interno e as obrigações com a dívida externa. A melhora da distribuição da renda interna, por mais que desejada, esbarrava na obrigação com o serviço da divida. Há aí uma inconsistência temporal entre a melhora das exportações e a remessa de recursos para o exterior. Para se melhorar o saldo da balança comercial brasileira seria necessário uma renovação tecnológica do parque produtivo nacional, contudo, os investimentos deveriam se dar em patamares muito elevados para possibilitar essa via de superação num cenário internacional de aceleração do progresso técnico.
A segunda interpretação aponta uma possibilidade de retomada do crescimento a partir de um ajustamento estrutural da economia. A ideia, defendida pelo então ministro Delfim Netto (1984), era de que era necessário ampliar o coeficiente de exportação usando uma política cambial ativa que alteraria os preços relativos provocando redução no coeficiente de importação e gerando excedente na produção para a exportação. A estratégia seria elevar os preços na moeda doméstica, reduzindo sua absorção, e também encarecer os bens importados. Delfim Netto acreditava que os efeitos multiplicadores das exportações seriam suficientes para dinamizar o mercado interno.
Já a terceira via de pensamento atribuía às mudanças estruturais provocadas pelo II PND a rápida superação da crise cambial.  Essa interpretação ressaltava a ausência de obstáculo externo ao crescimento e apontava ainda que as transformações provocadas pelo plano de desenvolvimento foram suficientes para a geração de superávit comercial de natureza estrutural e também para a superação do subdesenvolvimento.
Sem encontrar um novo padrão de crescimento, a economia viveu um período de estagnação. Carneiro (2002) aponta como principais contornos dessa estagnação o crescimento negativo do investimento, redução da propensão média a consumir e os superávits comerciais. O grau de instabilidade desse período é marcado por um período de intensa retração em 1981-1983, expansão nos três anos seguintes (1984-86) e uma nova retração no último triênio da década. As observações das variações do investimento e da geração de superávit comercial mostram uma incompatibilidade entre o aumento das exportações e a capacidade de absorção doméstica. Quedas no investimento no período recessivo provocavam retração das importações e aumento nas exportações. O contrário ocorria nos períodos de retomada do crescimento. Uma das razões da conciliação impossível entre transferências reais ao exterior e o crescimento sustentado está no mau desempenho do investimento, em especial na dissociação entre investimento privados e públicos. O setor produtivo estatal tem desempenho ruim e registra, em todo o período, decréscimo sistemático nos investimentos. A principal razão desse mau desempenho é a dependência do setor do financiamento externo, que já se esgotara naquela década. Já o setor privado não vê horizonte de crescimento dadas as fortes oscilações cíclicas, mesmo localizados em áreas de infraestrutura e insumos básicos. Como ressalta o autor, essas informações “atestam a desarticulação do padrão de desenvolvimento vigente por décadas na economia brasileira, no qual o investimento público e o do setor produtivo estatal desempenhavam o papel indutor do investimento privado” (Carneiro: 2002, p. 150).
De forma geral, Carneiro aponta, sustentado em dados de investimento e consumo, que aquele padrão de desenvolvimento defendido pela política econômica da época com base no incentivo ao setor exportador para servir de indutor do crescimento econômico se mostrou incapaz de se tornar um elemento indutor da dinamização da economia. Apesar do esforço, o crescimento do mercado interno continuou a dar o caráter dinâmico da economia e relegou o setor exportador um papel secundário, complementar. 
Consumo, outra variável também importante para a economia, também registrou momentos de oscilação. Houve redução na propensão média a consumir durante o período e fica evidente a capacidade de detentores da riqueza de se protegerem das oscilações inflacionárias dos preços convertendo ativos financeiros em bens de consumo duráveis. Tese visível na baixa correlação entre bens de maior durabilidade com o ciclo econômico. Famílias de mais alta renda foram responsáveis pelo expressivo crescimento das vendas de automóveis e materiais de construção, respectivamente nos anos de 1988 e 1989, período de retração da economia.
Há exceções no quadro de estagnação da economia. São elas os setores que receberam maior incentivo durante o II PND como celulose, papel e papelão e o setor de metalurgia, além dos setores que já eram tradicionais na exportação como o setor têxtil, calçados, produtos alimentares, madeira e couros e peles. Porém, de maneira geral, Carneiro insiste na tese de que o esforço de orientação exportadora foi insuficiente para atuar como um elemento dinâmico na economia brasileira. Ademais, o autor ressalta, mais de uma vez, que a substituição de importações permitiu “simultâneo aumento das exportações e do superávit comercial, tornando o setor responsável por cerca de 75% da ampliação total deste último” (Carneiro: 2002, p. 162).
A tese central do autor neste capítulo parece coincidir com a defesa que ele faz do período desenvolvimentista e de substituição de importações, nas décadas anteriores a 1980, em outros textos. Em seu texto para discussão (número 153), intitulado “Impasses do desenvolvimento brasileiro: a questão produtiva”[1] , o autor caracteriza o período de 1930 a 1980 como “um período nacional-desenvolvimentista, de progressiva diversificação da estrutura produtiva, por meio da industrialização” (p. 2). A leitura complementar ajuda a enxergar o quão perdida estava a política econômica na década de 1980 que, acostumada com o financiamento externo principalmente para garantir o desempenho das estatais, se vê, junto do setor privado, sem um horizonte de investimento capaz de cumprir com o almejado pelo governo que insistia na potência dinamizadora das exportações. O que se verá adiante, no período neoliberal, de forte impedimento do estado como agente econômico orientador dos investimentos no país, é que a dependência externa a que se coloca o Brasil se mostrou mais prejudicial à economia dado que num cenário de restrição dos financiamentos estrangeiros a pseudo-autonomia do desempenho brasileiro se coloca em cheque uma vez que não é mais capaz de andar com as próprias pernas. A insistência na orientação exportadora, dadas as variações e oscilações no investimento público e privado, parece ser, a partir da leitura, uma medida desesperada de retomar as relações com o capital estrangeiro e recorrer, sem sucesso, às práticas regulamentadas em manuais em detrimento da continuação do desenvolvimento interno principalmente nos setores estratégicos e de tecnologia, a exemplo das economias desenvolvidas e orientais.



[1] CARNEIRO, Ricardo. Impasses do desenvolvimento brasileiro: a questão produtiva. Campinas: Unicamp, 2008. Disponível em: < http://www.eco.unicamp.br/docprod/downarq.php?id=1783&tp=a> Acessado em 28 fev 2014

FIORI, José Luís. De volta à questão da riqueza de algumas nações (1999) - incompleto

Fichamento: FIORI, José Luís. De volta à questão da riqueza de algumas nações. In: FIORI, José Luís (org). Estados e moedas no desenvolvimento das nações. Petrópolis: Vozes, 1999. Pp. 11-46.

“Na imprensa mundial, como no debate político em vários países centrais ou periféricos, volta-se a questionar a obsessão antiinflacionária dos Bancos Centrais e muitas lideranças mundiais já assumem explicitamente a defesa de políticas econômicas que priorizem o aumento da produção e do emprego. Por trás dessas novas posições políticas – que entram em choque direto com as ideias hegemônicas deste último quarto de século – o que está se assistindo não é apenas a retomada de um debate teórico, mas o reconhecimento da gravidade da crise que se alastrou a partir do Leste asiático e da impotência das políticas ortodoxas para enfrentar os efeitos da convulsão financeira que vem projetando sobre o próximo milênio um horizonte de incertezas com relação aos países centrais e de pessimismo com relação às perspectivas econômicas da periferia capitalista” (p. 11)
Desde 1999 analistas previam uma desaceleração do crescimento europeu e norte-americano, recessão prolongada no Leste Asiático , regressão na Rússia e período de estagnação na América Latina. Controle mais eficaz do livre movimento dos capitais seria uma solução, mas representaria uma redução do poder das grandes potências. As economias nacionais acompanharam a tendência dos países centrais de declínio das taxas de investimento, crescimento e emprego. Além disso as diferenças sociais se acentuaram entre os blocos e também dentro deles.
“Em 1965, a renda média per capta dos 20% mais pobres (U$ 74 contra U$ 2.281), enquanto em 1980 essa diferença havia pulado para 60 vezes (U$ 283 contra U$ 17.056). A renda per capta dos latino-americanos, por exemplo, que em 1979 correspondia a 36% da renda per capta dos países ricos, baixou para 25% em 1995. Até o fim da década de 70, três países na América Latina mantiveram o crescimento da sua renda per capta: Brasil, Colômbia e México. Mas, a partir de 1980, o crescimento destes países despencou e eles perderam as posições que haviam conquistado em termos de participação na renda mundial. No caso do brasil, por exemplo, as taxas médias de crescimento anuial do seu PIB per capta passaram de 6% na década de 1970 para 0,96%¨na década de 1980 e algo em torno 0,60% entre 1990 e 1998, segundo dados do Instituto de Pesquisa Econõmica Amplicada do Ministério de Planejamento do governo brasileiro” (p. 13)
O processo de “financeirização” que ocorreu a partir de 1985 e as suas seguidas crises acentuaram a evolução deste quadro.

1. As profecias não cumpridas
“E foi, sobretudo, quando tentaram sustentar suas teses políticas nas suas análises econômicas que os teóricos da economia política clássica, em nome de um projeto científico, acabaram dando origem às grandes utopias modernas, sendo que a mais antiga delas – a utopia liberal – foi a que permaneceu viva por mais tempo, culminando na ideia da globalização.” (p. 15).
No final do século XIX, a partir de 1850, houve processo de concentração do poder político e da riqueza capitalista nas mãos de uma quantidade pequena, a maioria europeus; a Europa assumia o controle político colonial de ¼ do território mundial que constituíram “as redes comerciais e a base material do que chamado mais tarde de periferia econômica do sistema capitalista mundial” (p. 16).
“Nesse mesmo período, ainda quando tenha aumentado a desigualdade na distribuição da riqueza mundial, alguns poucos territórios privilegiados conseguiram superar o seu atraso com relação à Inglaterra, sendo progressivamente incorporados ao core do sistema capitalista global e à sua competição interna de tipo imperialista” (p. 16).
“Neste mesmo meio século, o resto do mundo incorporado à economia europeia, como colônias ou semicolônias, não conseguiu escapar à camisa-de-força de um modelo econômico baseado na especialização e exportação de alimentos e matérias-primas, e viveu um período de baixo crescimento econômico intercalado por crises cambiais crônicas. Em síntese, entre 1830 e 1914, a riqueza mundial cresceu, mas de forma extremamente desigual, ao mesmo tempo em que se expandia o poder político do núcleo europeu do sistema interestatal no qual foram incorporados os Estados Unidos e o Japão” (p. 16).
Entre 1870 e 1914 80% do comércio europeu segui entre os países mais ricos.
“Ao lado desta sua visão sobre os caminhos da Europa, List professava um profundo pessimismo ou fatalismo com relação ao “destino” dos povos tropicais e das nações pobres, que, segundo ele, deveriam seguir prisioneiras de suas especializações e obrigadas ao livre-cambismo inglês sem poder ambicionar uma convergência tecnológica com os Estados industrializados europeus” (pp. 21-22)
“(...) sobretudo na década de 1970, assistiu-se a uma diminuição global da distância entre a riqueza dos “países industrializados” e a dos “países em desenvolvimento” (Warren, 1980; Arrighi, 1995). Ainda quando se sabia que as estatísticas apontam nessa direção estejam fortemente inflienciadas pela crise generalizada dos páises mais ricos, e pelo crescimento excepcional do Leste Asiático e do brasil e México na américa Latina. O sonho contudo durou pouco e na década de 80 a queda foi muito mais rápida do que a ascensão. Em poucos anos foram varridos sucessivamente todos os “milagres” econômicos periféricos: primeiro caíram por terra, jpa nos anos 60, os poucos casos de sucesso africanos; depois, nas décadas de 70 e 80, ruíram sucessivamente os desenvolvimentismos latino-americanos; em seguida foi a vez dos “socialismos reais” e, agora, já no final da década de 90, são os “milagres econômicos” asiáticos que começam a andar para trás. De tal maneira que também o século XX vai chegando ao seu final deixando a forte uimpressão de que muito se andou para, na melhor das hipóteses, permanecer no mesmo lugar, do ponto de vista da distribuição do poder e da riqueza mundiais” (p. 23).
Diferença de riqueza entre os países mais e menos pobres: Em 1800 era de 1:1,8; e 1913 de 1:4 (Eric Hobsbawm); A relaçãoentre a renda média do país mais rico e o mais pobre do mundo, no começo do século XX era de 1:9 e no final de 60:1 (Nancy Birsdall).

UNCTAD: Trade and Development Report, 1981-2011: three decades of thinking development.

Fichamento: UNCTAD. Trade and Development Report, 1981-2011: three decades of thinking development. New York; Geneva: United Nations Commission on Trade and Development, 2012, chapter 5

Capítulo 5: Estratégias de Desenvolvimento: avaliações e recomendações

O capítulo 5 do relatório da Unctad faz um resgate dos trinta anos de atuação e recomendações da instituição. Ao longo de todo o texto, o documento traz as principais interpretações, avaliações e visões das diferentes conferências realizadas ao longo do tempo. É dada uma forte importância às experiências asiáticas de desenvolvimento, o que coloca o documento numa posição contrária aos relatórios emitidos pelo Banco Mundial no qual a menor participação do Estado é estimulada.
De acordo com o TDR (do inglês, Relatório de Comércio e Desenvolvimento), a liberalização comercial era vista como uma forma de melhorar a alocação de recursos baseada nas vantagens comparativas e aumento das receitas das exportações. A liberalização financeira, por sua vez, atrairia capital estrangeiro em busca de retornos altos em países que não atraiam capitais. Além disso, era esperado que um grande fluxo de Investimento Direto Externo (IED) iria não só acelerar o crescimento como também aumentar as reservas domésticas para a acumulação de capital, além de transferir tecnologia.
Embora a recuperação da América Latina no começo da década de 1990 tenha sido interpretada como um sucesso na liberalização financeira e comercial, o relatório de 1993 da Unctad observou que essa recuperação se baseou muito mais no consumo que no investimento. “It related the latter partly to the success of the Brady Plan (see also section 4.4.4 above), which had opened the floodgates to foreign capital, the return of flight capital, and increasing FDI in connection with privatization, which was a major element of SAPs.” (Unctad: 2012, p. 40). Nos relatórios de 1991, 1992, 1993 e 1995, a instituição alertou para a possibilidade de a liberalização financeira na América Latina seria insustentável, dada a fragilidade do sistema.

In 1999, the TDR observed that after more than a decade of liberal reforms in developing countries, their payments disorders remain as acute as ever and their economies depend even more on external financial resources. It found that growth rates were even lower than before the radical policy change, while many countries’ external deficits had worsened. Moreover, where trade balances have improved, there has generally been a slowdown in economic growth (99: VI). In 2003, the TDR noted that in Latin America this trend had been accompanied by a premature trend towards “deindustrialization”, as indicated by a declining share of manufacturing value added in total output (03: VII). (UNCTAD: 2012, p. 41)

A liberalização do capital levou a apreciação de moedas e instabilidades uma vez que esses capitais contribuíam pouco para a capacidade produtiva dos países que os recebiam. Além disso, a experiência de alguns países mostrou que as políticas de substituição de importações não poderiam efetivamente ser substituídas por uma economia liderada apenas pelo mercado simplesmente eliminando-se a inflação, diminuindo o setor público e abrindo o mercado ao comércio e capital internacionais. “In other countries these strategies created pressure to keep wages low, so that the domestic labour force did not share in the productivity gains” (Unctad: 2012, p. 41). Além de esta estratégia comprimir
Uma das passagens do texto mostra a contradição entre as visões do Banco Mundial e da Unctad de forma clara e explícita:

A study by the World Bank (1993) presented a distorted picture of the experiences of the newly industrializing economies (NIEs) of East Asia, explaining their success on the basis of traditional economics and market forces while overlooking the high degree of selective intervention by their governments, especially in the larger economies. Several issues of the TDR, on the other hand, identified various institutional and policy arrangements that had made the difference. (UNCTAD: 2012, p. 42)

Ainda sobre as economias asiáticas, o relatório mostra que, em outros documentos como os relatórios de 1996 e 2003, a Unctad já havia ressaltado a importância do Estado nestes países. Segundo o relatório de 2003, a abertura comercial na Ásia foi acompanhada por investimentos públicos. No documento de 1996 é descrito como o Estado atuou na abertura:

Initially they had no significant capital goods sector and produced mainly consumer goods. Exports, together with some limitation of imports of consumer goods, allowed domestic industry to expand without a corresponding growth in domestic consumption, and provided the foreign exchange needed for capital goods imports and access to advanced foreign technology. While success in raising investment depended crucially on export growth, export expansion in turn required new investment. Thus, rapid growth required mutually reinforcing dynamic interactions among savings, investment and exports (96: VII). (UNCTAD: 2012, p. 42)


Recomendações para estratégias de desenvolvimento
Embora alguns princípios das estratégias traçadas pela Unctad possam ser universais, a instituição reforça que cada país deve elaborar sua própria estratégia de desenvolvimento de acordo suas especificidades histórica, cultural e institucional e levando em conta também o contexto internacional. “On the one hand, developing countries have fewer policy options for outward-oriented strategies; on the other hand, new market opportunities have arisen” (Unctad: 2014, p.  43)
Dentro das considerações “universais”, dois elementos são essenciais para o desenvolvimento de qualquer país: uma base industrial robusta e uma administração ativa na integração na economia global. Sobre o segundo, há um alerta:

This should be guided by a sense of pragmatism rather than ideology: liberalization of trade and international capital flows should not be considered as objectives in their own right, but as instruments for development that are part of a broader development and growth strategy. (UNCTAD: 2012, p. 44)

As políticas industriais são importantes para garantir uma base sólida. Como observado no relatório da Unctad de 1997, o que diferencia os países  que se industrializaram no passado dos em desenvolvimento atualmente é que aqueles tinham um forte animal spirit na sua classe de empresários, o que era refletido nas taxas de poupança e investimentos dos lucros. Esta observação é feita no relatório após ele versar sobre a importância de conscientizar as elites dos países em desenvolvimento para a necessidade de investimentos produtivos, em especial no reinvestimento dos lucros e não apenas suas distribuições aos acionistas. Como esse animal spirit não surge espontaneamente, o governo deve se encarregar de incentivas os investimentos por meio da política fiscal e uma ação ativa no fechamento de canais de acumulação de riqueza não produtivos e o desencorajamento de consumo de luxo.

In addition to favourable monetary and financial conditions, and pressures and incentives from market forces, the right interventions and well-targeted incentives by governments play a crucial role in influencing the pace and direction of diversification and industrial upgrading. (UNCTAD: 2012, p. 44)

An export-investment nexus results when profits earned from exports lead to higher investment through (a) reinvestment of such profits, (b) stimulation of additional investment in the profitable export sectors, (c) stimulation of investment in other domestic industries through linkages with the exports sector, and (d) investment of fiscal revenues from export activities in education, health and infrastructure (02: XI; 05: IX). These, in turn, will enable higher and, over time, more sophisticated production for both export and domestic markets. (UNCTAD: 2012, p. 44)

Com base nas análises das experiências asiáticas, a Unctad mais uma vez critica a postura liberal do Banco Mundial e do Fundo Monetário Internacional e enfatiza a importâncias das políticas públicas para fortalecer a indústria:

But the divergent experiences of developing countries studied in the TDR had made it clear that exclusive concentration on allocative efficiency implies a lack of sufficient attention to stimulating the dynamic forces of markets which underlie structural change and economic growth, and that industrial policies were an important supportive factor for East Asia’s economic catch-up as well as for industrialization in today’s mature economies. (UNCTAD: 2012, p. 45)

Outra consideração da Unctad é quanto ao IDE. O documento reforça que estes investimentos precisam criar empregos, elevar o valor agregado doméstico, aumentar os ganhos com as exportações e apoiar a industrialização doméstica por meio da transferência de tecnologia. Embora muitos países tenham atraído IDE por meio de incentivos fiscais, algumas economias africanas e latino americanas não observaram crescimento como esperado. O relatório de 2003 da Unctad mostrou que grande parte destes investimento foi destinado mais a fusões e aquisições e menos em criação de novas empresas (greenfield). Além isso, muitas das fusões se deram no setor de serviços, o que potencialmente geraria dificuldades para pagamentos das dívidas. “Another important share of FDI went into the mining sector, and thus tended to shift the production structure away from sectors with the greatest potential for productivity growth (03: IX)” (Unctad: 2012, p. 45).

The TDR clearly adopted a position favouring proactive State involvement in shaping the development process over a laissez-faire approach on the grounds that markets alone, especially in developing countries, are unable to produce outcomes that reflect the social and economic interests of development and structural change. (Unctad: 2012, p. 46)

Além da esfera comercial, o relatório lembra que desde os anos 1990 a Unctad considerava mais importante que os países em desenvolvimento aprimorassem seus sistemas financeiros para servirem de suporte à indústria e ao comércio. “Finance must serve industry and commerce – not vice versa” (Unctad: 2012, p. 46).

According to the TDR, domestic conditions for the financing of investment in productive capacity depend on three elements: first, a monetary policy that keeps the cost of finance low; second, strengthening the domestic banking system and the role of governments in the allocation of credit; and third, regulation of the domestic financial sector. (Unctad: 2012, p. 46)

No quesito integração internacional, a Unctad reforça a ideia de que o comércio internacional deve ser um instrumento do desenvolvimento e não o fim em si. Neste ponto, o relatório faz considerações tanto sobre a liberalização em geral quanto a financeira:

This can be achieved only through a carefully managed and phased integration into the world economy, tailoring the process to the level of economic development in a country and capacity of existing institutions and industries. Such a strategy contrasts sharply with the “big bang” liberalization adopted by some countries in recent years. (Unctad: 2012, p. 47)

Financial liberalization can bring benefits provided that considerable industrial advance has already been achieved, and strong institutions and markets and competitive industries are in place. It should be undertaken gradually and without preventing the Government from pursuing an active industrial policy (91: VII). (…) A rapid opening up of the capital account and overdependence on private capital inflows not only increases the vulnerability of the domestic economy to external shocks transmitted via the capital account; it also implies a number of important constraints on the autonomy of developing countries in the conduct of macroeconomic policy (see section 5.3.3). (Unctad: 2012, p. 49)

Como conclusão do capítulo, o relatório mostra que a liberalização, de forma geral, diminuiu o espaço das políticas públicas, além de fragilizar economias deixando-as vulneráveis a choques externos quanto a dependência do capital internacional era muito grande.

Without a sufficient number of policy instruments that can be used effectively to dampen inflationary risks, the attempt to boost development through expansionary macroeconomic policies is likely to fail, as inflation will rapidly flare up. Conversely, countries that successfully use heterodox instruments to achieve price stability have more room to employ macroeconomic policy to spur an investment-led development process (06: XVI; also 7: XVII). (UNCTAD: 2012, p. 51)




PNUD: Relatório de Desenvolvimento Humano 2010.

Fichamento: PNUD. Relatório de Desenvolvimento Humano 2010. Portugal: IPAD, 2010. Visão geral.

O relatório da PNUD marca 20 anos do lançamento do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), lançado em 1990 como uma alternativa para avaliar as condições de desenvolvimento levando em conta a renda, a saúde e a educação.  No novo documento a instituição lança mais três índices para aprimorar seu instrumental de análise do tema: o Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade, o Índice de Desigualdade de Gênero e o Índice de Pobreza Multidimensional.
Este último ponto se mostra, na minha opinião, como um dos mais expressivo dos três por ser um reconhecimento de que a pobreza não é tão simples quanto parece.

O índice [de Pobreza Multidimensional] identifica privações nas mesmas três dimensões que compõem o IDH e mostra o número de pessoas que são pobres (que sofrem um dado número de privações) e o número de privações com as quais as famílias pobres normalmente se debatem. (PNUD: 2010, p. 8)

De acordo com os dados apresentados pelo PNUD, cerca de 1,75 bilhões de pessoas dos 104 países analisados vive em estado de pobreza multidimensional o que reflete uma privação grave na saúde, na educação ou no padrão de vida. Além disso, o relatório aponta que metade dessa população vive no Sul da Ásia e mais de um quarto na África.
O novo IDH Ajustado à Desigualdade tem seu nome autoexplicativo. As considerações feitas pelo PNUD sobre este ponto caminham na direção de que IDH e IDHAD podem revelar situações bem distintas em países:

A perda média do IDH devido à desigualdade é de cerca de 24% - ou seja, ajustado à desigualdade, o IDH global de 0,68  em 2010 cairia para 0,52, o que represntea uma queda na categoria do IDH de elevado para médio. As perdas vão dos 6% (República Checa) aos 45% (Moçambique), com quatro quintos dos países a perderem mais de 10% e quase dois quintos dos países a perderem mais de 25%. (PNUD: 2010, p. 8).

Já a questão da desigualdade de gênero se fez importante na visão do PNUD por conta das dificuldades enfrentadas pelas mulheres na sociedade, quer seja por conta de discriminação na saúde, na educação e no mercado de trabalho. Um dado surpreendente para quem não conhece muito a cultura de países europeus é verificar que o relatório aponta que os países com maior desigualdade de gênero são os Países Baixos, a Dinamarca, a Suécia e a Suíça, na sequência.
As três questões também retomam um ponto do relatório de 1990 que é o tolhimento das liberdades individuais dadas as desigualdades geradas pelo desenvolvimento não satisfatório. Esta questão também traz uma reafirmação da instituição sobre o desenvolvimento humano que “tem a ver com a sustentação regular de resultados positivos ao longo do tempo e o combate contra os processos que empobrecem as pessoas ou estão subjacentes à opressão e à injustiça estrutural” (PNUD: 2010, p. 2).
Num balanço dos 20 anos entre os dois relatórios, um dos destaques é para a evolução das políticas democráticas. Tendo caminhado para sistemas mais “saudáveis”, as pessoas são mais capazes de eleger seus líderes e cobrá-los e responsabilizá-los pelos seus atos.
De forma geral a média mundial do IDH subiu 18% no mesmo período considerado acima. Esse salto gera melhoramentos na esperança de vida, nas matrículas escolares, na alfabetização e no rendimento. Apenas três de 135 países tiveram um IDH, em 2010, menor do que aquele calculado para o ano de 1970 (República Dominicana do Congo, Zâmbia e Zimbabwe). No outro extremo, os casos de sucesso têm como principais representantes a China, a Indonésia e a Coreia do Sul.
Embora as evoluções (ou não) do IDH sejam diferentes, o relatório admite que há “diferentes pontos de partidas”. Além disso, outros fatores como políticas, instituições e geografia também são importantes para a questão. Na questão das políticas, é observado uma maior participação do Estado na Educação cujo progresso “tem sido substancial e generalizado, reflectindo melhoramentos não apenas na quantidade de escolaridade mas também na igualdade de acesso à educação entre rapazes e raparigas” (PNUD: 2010, p. 4). Contudo, a distância entre países ricos e pobres continua a aumentar.
Outro ponto considerado pelo PNUD “surpreendente” seria a inexistência de uma correlação entre crescimento econômico e melhoramentos na saúde e educação embora o crescimento da renda ainda seja uma importante prioridade política. Porém, além de declarar que não há correlação entre desenvolvimento e crescimento, o relatório também admite que é possível ter o primeiro sem necessariamente um resultado substancial do primeiro.
Não só o relatório afirma que crescimento não leva a desenvolvimento como também ressalta que o modelo adotado pelo país não pode ser transplantado de outra experiência. Há condições diferentes e limitações estruturais e políticas específicas a cada economia que exige uma “investigação cuidadosa”. Embora precise dessa especificidade, a ação do governo não pode deixar de considerar o meio ambiente e procurar uma política que evite a degradação ambiental por parte dos mercados.
Tratando do papel do Estado, o relatório faz uma crítica:

(...) os regimes de substituição de importações de muitos países da América Latina vacilaram quando os países tentaram desenvolver uma política industrial direcionada. Em contraste, uma lição importante extraída dos sucessos da Ásia do Leste foi a de que um Estado capaz e focado pode ajudar a impulsionar o desenvolvimento e o crescimento dos mercados. A determinação do que é possível e apropriado depende do contexto. (PNUD: 2010, p. 6)



PNUD: Desarrollo Humano Informe 1990.

Fichamento: PNUD. Desarrollo Humano Informe 1990. Bogotá: Tercer Mundo, 1990. Resumen.

Informações sobre o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD):

O Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) é a rede de desenvolvimento global da Organização das Nações Unidas. O PNUD faz parcerias com pessoas em todas as instâncias da sociedade para ajudar na construção de nações que possam resistir a crises, sustentando e conduzindo um crescimento capaz de melhorar a qualidade de vida para todos. Presente em mais de 170 países e territórios, o PNUD oferece uma perspectiva global aliada à visão local do desenvolvimento humano para contribuir com o empoderamento de vidas e com a construção de nações mais fortes e resilientes.
(...)
Em 1990, o PNUD introduziu universalmente o conceito de Desenvolvimento Humano, que parte do pressuposto de que para aferir o avanço na qualidade de vida de uma população é preciso ir além do viés puramente econômico e considerar três dimensões básicas: renda, saúde e educação. Esse conceito é a base do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e do Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH), publicado anualmente pelo PNUD.
Fonte: site do PNUD Brasil. Disponível em:
< http://www.pnud.org.br/SobrePNUD.aspx> Acessado em 3 dez. 2014


Prefácio

No prefácio do documento, o administrado do PNUD, William H. Draper III, ressalta que o mundo vivia uma grande agitação em 1990 com o reforço da democracia em países onde o sistema político até então suprimia a liberdade da sociedade. Naquele cenário ficou evidente que o centro do desenvolvimento deveria ser o ser humano. Além de garantir bem estar social, esse desenvolvimento deve também contar com “una vida prolongada, conocimientos, libertad, política, seguridad personal, participación comunitaria y derechos humanos garantizados” (PNUD: 1990, p. 13).
O documento de 1990 é o primeiro feito pelo PNUD sobre desenvolvimento humano. Sua mensagem principal é que é preciso aumentar a produção nacional com meio para garantir os objetivos essenciais ao homem. A partir deste objetivo, o relatório se propõe a estudar como algumas sociedades conseguiram conquistar alto nível de renda per capta e quais políticas esses países adotaram.

Prólogo da edição em espanhol

Augusto Ramirez Ocampo, diretor do PNUD na América Latina e Caribe, destaca as dificuldades que a “década perdida” provocou nos países do continente. Segundo ele,

Al terminar esta década, 200 millones de los pobladores del territorio que integra nuestra geografía vivirán en condiciones de pobreza critica. Esta carga de miseria humana, que en la región se ha venido llamando “nuestra deuda social”, ya nos representa una agenda plena de desafíos. (PNUD: 1990, p. 16)

Uma vez que a década também marcou a volta da democracia, o desenvolvimento econômico com justiça social deve ser um objetivo da política por meio de transformações nas estruturas distributivas. Este fato representa um ponto de inflexão.
O diretor do PNUD também apresenta os três componentes do Índice de Desenvolvimento Humano criado pelo programa. No entendimento do PNUD o desenvolvimento é não apenas econômico, mas sim um projeto para ampliar as oportunidades dos indivíduos. Fazem parte do IDH:

La longevidad, como expresión de una atención adecuada de la salud u la nutrición.
2) El conocimiento, como consecuencia de una adecuada educación primaria, secundaria y terciaria y, ojalá, en el futuro, de la ciencia y la tecnología.
El PIB per capta, pero incluyendo en el análisis la distribución de éste entre la población. (PNUD: 1990, p. 17)


Resumo

O desenvolvimento humano é um processo que visa a oferecer mais oportunidades às pessoas. O documento destaca, principalmente, uma vida longa e saudável, educação e acesso a recursos básicos para se ter uma vida decente. Além disso, também entram nesta lista a liberdade política, a garantia de direitos humanos e o respeito a si mesmo.

Nadie puede garantizar la felicidade humana y las alternativas indiciduales son algo muy personal. Sin embargo, el proceso de desarrollo debe por lo menos crear un ambiente propicio para que las personas, tanto individual como colectivamente, puedan desarrollar todos sus potenciales y contar con una oportunidad razonable de llevar una vida productiva y creativa conforme a sus necesidades e intereses. (PNUD: 1990, p. 19)

 De forma geral, o documento analisa a experiência de 15 países ao longo das três décadas entre 1960 e 1980. A partir dos estudos, o resumo do documento elenca 15 principais conclusões e mensagens sobre políticas que serão fichados abaixo.

1.      Os países em desenvolvimento realizaram progressos significativos em matéria de desenvolvimento humano nas últimas três décadas.
Alguns números e crescimentos dos principais indicadores.
Positivos, que exprimem as melhoras nas últimas décadas:
·         Expetativa de vida: 46 anos em 1960 para 62 em 1987;
·         Índice de alfabetismo adulto: de 43% para 60%;
·         Taxa de mortalidade infantil (>5 anos): reduziu pela metade;
·         Cobertura da atenção médica primária: ampliação para 61% da população;
·         Acesso à água potável: ampliação de 55%;
·         Número de habitantes nos países em desenvolvimento: crescimento de 2 milhões;
·         Produção de alimentos: incremento de aproximadamente 20% acima do crescimento da população;

Negativos, que mostram o retrocesso ou falta de evolução:
·         Pessoas ainda em situação de pobreza: 1 bilhão;
·         Analfabetos: 900 milhões;
·         Pessoas sem acesso à água potável: 1,75 bilhão;
·         Pessoas sem habitação: 10 milhões;
·         Pessoas que passam fome: 800 milhões;
·         Crianças (>5 anos) em situação de desnutrição: 150 milhões;
·         Crianças que morrem antes do primeiro ano: 14 milhões.

2.      A lacuna Norte-Sul no campo do desenvolvimento humano básico reduziu consideravelmente durante as últimas três décadas, apesar de que a lacuna da renda se ampliou.
Os países em desenvolvimento conseguiram reduzir a distância entre os países desenvolvidos. O relatório mostra que em 38 anos (entre 1950 e 1988) a mortalidade infantil passou de 200 em 100 para 80 em 1000. Contudo, ainda em 1987 a expectativa de vida média era 20% menor que a daqueles países, assim como o índice de alfabetismo que era 44% menor. Há esperança de que os países em desenvolvimento consigam melhorar suas estatísticas de forma rápida e modesta, dados os avanços na tecnologia e um esforço dos governos.

3.      As médias de progresso quanto ao desenvolvimento humano ocultam grandes disparidades dentro dos países em desenvolvimento, entre as zonas urbanas e rurais, entre homens e mulheres e entre ricos e pobres.
As zonas rurais têm metade do acesso aos serviços básicos de saúde que as urbanas têm. Além disso, só 25% do acesso aos serviços sanitários. As taxas de alfabetismo feminino ainda representa um terço do masculino e a taxa e mortalidade materna é 12 vezes maior que nos países do norte. Quanto às diferenças entre riscos e pobres, o relatório mostra que famílias de maior renda têm níveis de educação, saúde e nutrição bem maiores que os pobres. “La razón primordial de las intervenciones gubernamentales se debilita considerablemente si los gastos sociales, en lugar de mejorar la distribución de ingresos, la empeoran” (PNUD: 1990, p. 22).

4.      É possível alcançar níveis bastante respeitáveis de desenvolvimento humano junto com níveis de renda bastante modestos.
O relatório mostra, a partir dos dados abaixo, que não é preciso uma renda per capta grande para se desenvolver. “Lo verdaderamente importante es cómo se maneja u distribuye el crecimiento económico para beneficio del ser humano” (PNUD: 1990, p. 22).

País
Renda per capta
Expectativa de vida (anos)
Taxa de alfabetismo
Sri Lanka
US$ 400
71
87%
China
US$ 290
70
69%
Brasil
US$ 2.020
65
78%
Arábia Saudita
US$ 6.200
64
55%
Fonte: elaboração própria com dados do PNUD (1990: p. 22)

5.      Não existe um vínculo automático entre crescimento econômico e progresso humano.
Países com baixo gasto social (Paquistão e Nigéria) ou má distribuição de renda (Brasil), são usados pelo relatório como provas de que crescimento econômico sem um projeto sólido de gasto social ou de distribuição de renda não conseguem promover desenvolvimento humano adequado. “Dichas políticas no funcionan indifinidamente si se carece de un crecimiento bien distribuido. A largo plazo países pueden o no tener un progreso sostenido en términos de desarrollo humano o si el progreso inicial se interrumpe o retrocede” (PNUD: 1990, p. 23).

6.      Os subsídios sociais são absolutamente necessários para os grupos de menor renda.
Poucas vezes o crescimento econômico se transfere para as massas dada a distribuição desigual de renda nos países do Terceiro Mundo.

Los mecanismos del libre mercado pueden ser de importancia crucial para lograr una asignación eficiente, pero no garantizan una distribución justa. Esta es la razón por la cual se requiere la adopción de políticas complementarias para transferir ingresos y otras oportunidades económicas a los muy pobres. (PNUD: 1990, p. 23)

Os beneficios sociais devem ser bem administrados. Assim eles trazem maiores beneficios para os países em desenvolvimento quando são usados como ferramentas eficientes de distribuição de renda.
7.      Os países em desenvolvimento não são tão pobres para não poder pagar pelo desenvolvimento humano e atender ao seu crescimento humano.
“La idea según la cual el desarrollo puede promoverse unicamente a costa del crecimiento económico es uma falácia. Descvirtúa el propósito del desarrollo y subestima el rendimento de las inversiones em salud y educación” (PNUD: 1990, p. 24). Sendo assim, a prioridade dos governos deveria ser um equilíbrio entre os gastos econômicos e sociais. Gastos militares, amortização da dívida, produções estatais ineficientes e controles governamentais e subsídios sem objetivos bem definidos são itens citados pelo documento que atrapalham os gastos sociais. Os gastos militares nos países do Terceiro Mundo é menor que o em educação em saúde. Aquele corresponde a 5,5% do Produto Nacional Bruto, estes a 5,3%. Os governos devem, portanto, promover uma reestruturação de suas prioridades nas áreas de educação, saúde, produção, entre outros.

8.      Os custos humanos dos ajustes frequentemente são optativos e não coercitivos.
Mais uma vez o documento cita os gastos militares como uma barreira ao desenvolvimento humano em alguns países. Quando o título deste item se refere à “optativo e não coercitivo” ele se refere ao fato de os gastos sociais deverem ser uma opção política para os governos em épocas de crise e recessão. Essa opção deve ser a última na lista de cortes e não a primeira, como ocorre em alguns países. Na questão militar o texto traz uma crítica quanto ao aumento destes gastos e o fato de a pobreza de alguns países não ser um obstáculo para as decisões políticas de aumentar os recursos para a área bélica.

9.      É indispensável contar com um ambiente externo favorável que respalde as estratégias de desenvolvimento humano na década de 1990.
As perspectivas para a década de 1990 não eram boas dadas as transferências de recursos para os países em desenvolvimento que se encontrava escassa na década de 1980. Para que os fluxos voltassem a ser positivos, seria necessário renegociações de dívidas com o FMI e o Banco Mundial para dar uma solução ao problema que se agravou na década anterior.

10.  Alguns países em desenvolvimento, especialmente na África, necessitam de mais assistência externa que outros.
Os países africanos concentram as maiores taxas de mortalidade infantil, de analfabetismo e as menores rendas per captas. A estimativa é de que se demore 25 anos para que o continente consiga fortalecer seu potencial humano e suas instituições nacionais. Por conta disso aqueles países merecem mais atenção que os restantes.

11.  Se a cooperação técnica tem como propósito ajudar a consolidar atitudes humanas e capacidades nacionais nos países em desenvolvimento, é preciso submetê-la a um processo de reestruturação.
Países em desenvolvimento carecem de mão-de-obra qualificada. Por conta disso é importante um intercâmbio meior de conhecimento e capacidades entre estes e os países desenvolvidos. Além disso, os países do Primeiro Mundo devem dar assistência aos do Terceiro para ajuda-lo a elaborar seus projetos de desenvolvimento humano.

12.  Um enfoque participativo incluindo a participação de Organizações Não Governamentais é vital em qualquer estratégia que visa alcançar um desenvolvimento humano exitoso.

Las ONG suelen ser pequeñas, flexibles y eficientes en relación con los costos, y casi todas tienen como propósito promover un desarrollo autosuficiente. Reconocen que cuando las personas fijan sus propias metas, desarrollan sus propios enfoques y toman sus propias decisiones, dan renda suelta a la creatividad humana u a su talento para resolver problemas locales, y es más probable que el desarrollo resultante sea autosuficiente. En cualquier viable de desarrollo humano es esencial contar con una política global de participación de las ONG. (PNUD: 1990, p. 28)

13.  É imperativo reduzir drasticamente as taxas de crescimento demográfico para alcançar melhoras apreciáveis nos níveis de desenvolvimento humano.
Segundo o PNUD a participação da população de países em desenvolvimento no total da população mundial aumentou de 69% em 1960 para 84% em 1987. Além disso, 87% dos nascimentos ocorrem nos países do Terceiro Mundo. Sendo assim, o documento ressalta a importância de maiores programas de controle de natalidade que trabalhem na alfabetização feminina, na redução da fertilidade e na atenção médica materna e infantil.

14.  O crescimento acelerado da população nos países em desenvolvimento está concentrado nas cidades.
A população urbana vem aumentando cada vez mais nas últimas décadas. Por conta disso, o PNUD indica programas para cuidar de quatro problemas críticos:

·               Descentralizar el poder y los recursos del gobierno central para transferirlos a los municipios.
·               Movilizar los ingresos municipales provenientes de fuentes locales com la participación activa de organismos privados y comunitarios.
·               Hacer énfasis en las estrategias “constructivas” en materia de vivienda e infraestructura, incluida la asistencia para los grupos más débiles.
·               Mejorar el entorno urbano, especialmente para la vasta mayoría de la población urbana pobre que vive tugurios y barrios de invasión. (PNUD: 1990, p. 29)

15.  As estratégias de desenvolvimento sustentável devem satisfazer as necessidades da presente geração sem comprometer a capacidade das futuras gerações de satisfazerem seus próprios requerimentos.


“Cualquier forma de deuda – financeira, de negligencia humana o de la degradación ambiental – es como “pedirles prestado” a las seguientes generaciones. El desarrollo sostenido debe estar dirigido a limitar todas estas deudas” (PNUD: 1990, p. 29). A pobreza, no ponto de vista do PNUD, é uma das maiores ameaças ao meio ambiente por provocar desmatamento, desfertilização, salinidade e contaminação da água. Contudo, a proteção ambiental deve também partir das nações ricas uma vez que, embora tenham apenas 20% da população mundial, são responsáveis por mais da metade da emissão de gazes nocivos ao meio ambiente.