sábado, 6 de julho de 2013

Fichamento João Manoel CARDOSO DE MELO (sem formatação)

Introdução - debate dobre a criação da Cepal e a importância da industrialização para os países latino-americanos.

As economias periféricas enquanto exportadoras de produtos primários (mais tarde
se diria: na etapa do desenvolvimento para fora) não dispõem, assim, de comando sobre seu próprio crescimento, que, ao contrário, depende, em última instância, do vigor da demanda cêntrica. 16

Demanda do centro por produtos primários vai de 1880 a 1914 - marca o nascimento das
economias periféricas - teve pouco dinamismo por conta do lento crescimento dos
países do centro e e à queda do seu coeficiente de importações - dá raiz para a
deterioração
das relações de troca;

os
problemas e, ao mesmo tempo, a especificidade da industrialização
latino-americana decorrem de seu caráter periférico. Ou melhor: a industrialização
latino-americana é problemática porque periférica.

O
núcleo do problema da industrialização reside na antinomia entre a plena
constituição da Nação e uma certa divisão internacional do trabalho que a havia
convertido em Periferia, quer dizer, numa economia que era comandada por
decisões tomadas no Centro, porque sua dinâmica estava presa, em última
instância, à demanda externa, As economias periféricas, enquanto dependentes,
são mero prolongamento do espaço econômico das economias centrais e não se
poderiam considerar como economias nacionais. 21

Penso,
portanto, que Dependência
e Desenvolvimento
representa uma tentativa de constituir uma nova problemática, a problemática da “instauração de um modo de produção capitalista em formações sociais que encontram na dependência seu traço histórico peculiar”, a
problemática da formação e
do desenvolvimento do modo de produção capitalista na América Latina.
Mais que isto, traz, a meu juízo, entre outras, uma contribuição fundamental: a ideia de que a dinâmica social latino-americana é determinada, em primeira instância, por “fatores internos”, e, em última instãncia, por “fatores externos”, a partir do momento em que se estabelece o Estado Nacional. 26

Capítulo 1: As raízes do capitalismo retardatário

“O
caráter primário-exportador não decorre simplesmente da forma material da produção predominante, alimentos e matérias-primas, e da localização do mercado em que se realiza, o externo. Ao contrário, advém, fundamentalmente, de que as exportações representam o único componente autônomo de crescimento da renda, e, ipso facto, o setor externo surge como centro dinâmico da economia” – 31
Setor externo – fonte de dinamismo
Setor interno – dependente do externo, integrado por industrias, agricultura mercantil de alimentos e matérias-primas e por atividade de subsistência.
Primeiras análises históricas cepalinas parte de um capital como fator da produção identificado com instrumentos de trabalho que ligados com homens e recursos naturais define uma função de produção; qual seria a diferença entre eco prim-exp e a colonial? “Indiscutivelmente, no modo de inserção das economias nacionais latino-americanas na nova divisão internacional do trabalho que se vai estruturando a partir da Revolução industrial.” (32) Antes, colônia que produzia para a burguesia mercantil metropolitana; Depois, Estado-nação produzindo para os países industriais. “Não é de espantar, portanto, que a passagem da economia colonial à economia primário-exportadora seja vista quase como resultado puro e simples das transformações ocorridas no nível de mercado mundual, comandadas pelos países centrais, verbi gratia pela Inglaterra” (p. 32)
Discutindo sobre os “formalismos” do paradigma cepalino, JMCM compara novamente as duas estruturas do ponto de vista dos instrumentos de trabalho e da mão de obra e diz que “não é difícil compreender que o surgimento das economias exportadoras organizadas com trabalho assalariado deve ser entendido como o nascimento do capitalismo na América Latina. Não, é certo, do modo especificamente capitalista de produção, desde que não se constituem, simultaneamente, forças produtivas capitalistas, isto é, desde que a reprodução das relações sociais de reprodução capitalistas não está assegurada endogenamente, quer dizer, no âmbito das próprias economias latino-americanas” (p. 33)
Discussçao sobre o modo de ser da economia colonial e de sua dinâmica
Weber e o conceito de plantation: trabalho compulsório, produção para mercado, produtos agrícolas. JMCM cita outro autor, Gray, que define as plantations como “um tipo capitalista de organização agrícola”.
Por ser escravista o afasta do Klismo moderno; o senhor precisaria adquirir seu trabalhador ao invés de contratar por um salário – é uma fragilidade deste modo de produção. Eram necessários, na ótica de Weber, escravos baratos e terras ilimitadas (=deslocamento constante da fronteira agrícolas pq os escravos eram incapazes de assimilar procedimentos técnicos). Falta destes pontos põe fim à elas. Weber permite classificar a economia colonial em economia de plantation ou de semi-plantation.
1.1 Da economia colonial à economia exportadora capitalista
* Contornos da economia colonial
§      2 setores: exportador (de larga escala, prods coloniais p/ mercado mundial) e produtor de alimentos;
§      Trabalho compulsório, servil ou escravo;
§      Setor de alimentos: mercantil na medida do tempo de trabalho no setor exportador. Pode ter trabalho escravo ou independente;
§      Altamente especializada;
§      Complementar à economia metropolitana: Ms de manufaturados e escravos e Xs de produtos coloniais;

Escravidão não é explicada pela falta de homens na metrópole; monopólio tbm não é explicado só pela ótica do lucro – JMCM cita a ideia de F.Novais sobre a inserção da eco.colonial no modo de produção klista e sua função de instrumento de acumulação primitiva de k. Essa economia deveria produzir excedente para dar lucros ao serem comercializadas no merc. Internacional; criar mercados coliniais para a prod da metrópole; e lucro apropriado pela burguesia metropolitana. “Produção colonial, sem suma, quer dizer produção mercantil complementar, produção de produtos agrícolas coloniais e de metais preciosos” 41 (citando Novais)

JMCM continua citando F.Novais nos seguintes pontos:
ª       Emprego compulsório mais rentável para manter taxas de lucro;
ª       Tráfico negreiro como setor do comércio colonial e “mola de acumulação”;
ª       Reiventar a servidão
ª       Monopólio do comércio como mecanismo de transferência de renda;
ª       Tributação das economias mineiras;

Capital comercial invadiu a esfera da produção, criou a economia colonial dando caráter mercantil.

“Transição do feudalismo para o capitalismo abstraindo o papel desempenhado pelas economias coloniais”??? “tanto a acumulação de capital e sua concentração nas mãos da burguesia comercial metropolitana, quanto à criação de mercados coloniais foram fatores essenciais (digo essenciais, não únicos ou mais importantes) à constituição do capitalismo” (p. 44)

“há, formalmente, capitalismo porque a escravidão introduzida pelo capital e a gênese da economia colonial recebe todo o peso que lhe é devido. Há capitalismo, formalmente, porque o capital comercial invadiu a órbita da produção, estabelecendo a empresa colonial. Indo muito além do simples domínio direto da produção, o capital subordina o trabalho e esta subordinação é formal, porque seu domínio exige formas de trabalho compulsório. Fica claro, enfim, que o decisivo são as articulações entre capitalismo e colonização, o caráter de instrumento de acumulação primitiva da economia colonial” (p. 46)

* Contradições entre Klismo industrial  e a economia colonial

©       Produção mercantil deve dar lugar para produção em massa para baixar os cusos de reprodução da força de trabalho;
©       Trablaho compulsório contra mercantilização das forças de trabalho;
©       Monopólio do mercado colonial impede que o K-comercial seja uma face do K-industrial;
©       Exclusivismo colonial impede livre circulação e preços livres;

Que poder dispunha o capitalismo para moldar a periferia?
Revolução Industrial promove crise das economias pré-capitalistas; estimula fim do pacto colonial;
Na América Latina o poder de difusão é pequeno porque os Estados nacionais enfrentavam dificuldades internas de organização de economias exportadoras vigorosas, ou seja, não tinham oportunidades de inversão atrativas;

Entre 1880 e 1900 há a emergência do Klismo monopolista: concentrações, monopolizações de principais mercados industriais, comando do K-financeiro, exportações de Ks, surge o colonialismo monopolista.

“Por tudo, penso correto falar num capitalismo importado, imposto pura e simplesmente ‘de fora para dentro’, uma vez que os ‘fatores internos’ a tais economias não jogaram qualquer papel na dinâmica de seu nascimento” (p. 53)

Áreas vazias coloniais se convertem em grandes produtoras de alimentos: imigração maciça, instauração da propriedade privada e do capital, importação de meios de produção + K – montagem da infraestrutura p/ empresa Klista exportadora de alimentos.

“Na América Latina, entre, grosso modo, 1880 e 1900, tanto a extraordinária ativação da exportação de capitais (...), quanto, em alguns casos, a imigração em massa, foram cruciais ao nascimento das economias exportadoras capitalistas. Não se pode, porém, pensar nem em ‘importação’, nem em ‘transplante do capitalismo’, uma vez que aquele movimento não se reduz ao movimento das economias industriais: ao contrário, há que partir da dinâmica das economias nacionais latino-americanas e, então, demonstrar de que modo as exportações de capitais e a imigração se ‘engancham’ nela e a transformam ‘de dentro’”(p. 54)


1.2 A passagem da economia colonial à economia exportadora capitalista no Brasil

1.2.1 O início da crise da economia colonial e a constituição da economia mercantil-escravista cafeeira nacional

Marcos para a crise da econ. colonial: queda do exclusivismo + formação do Estado Nacional.

Como nasceu a economia mercantil-escravista cadeira nacional?
Quantum de capital-dinheiro dá origem à terras, meios de produção e escravos; juntos se transformam em mercadoria e no final geral lucro.

Considerações para a gênese da economia mercantil escravista cafeeira
1) Origens do capital-dinheiro
2) existência e mobilização de recursos produtivos
3) nascimento e sentido da demanda externa por café

(1)
 “A economia mercantil-escravista cafeeira nacional é obra do capital mercantil nacional, que se viera formando, por assim dizer, nos poros da colônia, mas ganhara notável impulso com a queda do monopólio de comércio metropolitano e com o surgimento de um muito embrionário sistema monetário nacional, consequências da vinda, para o Brasil, da Família Real, o passo decisivo para a formação do Estado Nacional.” (56)

Invasão da órbita da produção pelo klismo mercantil nacional: fazendas de café foram organizadas com capitais transferidos diretamente do setor mercantil; comissários custeando essas montagens de fazendas;

Citando Franco(1969): comissários foram pivots da comercialização em massa.

(2)
Recursos produtivos prévios: terras próximas ao RJ e escravos liberados da economia mineira. Porém não são suficientes para explicar o início desta atividade. Não é lícito pensar na transferência inter-regional de escravos. Argumentação de JMCM: escravo é ativo, transferência é transf de propriedade. Já as terras requeriam dinheiro para compra da posse.

Outro problema de financiamento: peculiariedades do plantio do café (tempo de maturação, gastos com plantio e demora para os lucros...)

(3)
Consumo do café se generaliza nas três primeiras décadas do sec XIX;
Baixa de preços internacionais por conta do crescimento da oferta brasileira;
Oferta brasileira explica ampliação constante da demanda que estimula mais oferta;

Adquire a forma de latifúndio pq:
- exige repartição prévia de terras;
- preços dos recursos produtivos e necessidade de se produzir em massa geram margem de lucro reduzida o que impõe escala mínima de produção, o que determinava grandes investimentos (eram barreiras à entrada);

Adquire a forma de latifúndio escravista pq:
- escravos estavam disponíveis;
- dado a demanda externa e os investimentos exigidos, o trabalho escravo era mais rentável;
- Não usou assalariados pq “a taxa de salários dever-se-ia fixar em níveis elevados, pois haveria de compensar aos olhos dos produtores diretos e alternativa de produzirem sua própria subsistência, como posseiros ou pequenos proprietários.” (59)
<<fica mais uma vez marcada a lógica de dominação sobre a população/economia, uma vez que persiste a lógica de uso do trabalho escravo para garantir que não haja outras livres-iniciativas em território nacional!>>

Traços definitivos: “grande empresa produzindo em larga escala, apoiada no trabalho escravo, articulada a um sistema comercial-financeiro, controlados, uma e outro, nacionalmente” (60)

(=) estabelecimento de uma economia nacional!

1.2.2 A dinâmica da economia mercantil-escravista cafeeira nacional

Condições p/ o desenvolvimento:
1)    Disponibilidade de trabalho escravo barato;
2)    Terras;
3)    Condição de realização autônoma;

(1)
Setor fornecedor de escravos desaparece em 1850.
Não havia meios para progresso técnico que poupasse o uso de escravos – escravos eram incapazes de manejar técnicas e máquinas;
- Necessidade de Produção interna de escravos deveria assegurar tx de natalidade>tx mortalidade; Até 1850, a tx de crescimento era negativa dada a enorme exploração do escravo;
- Para tx crescimento>0 era preciso menor exploração = cortar tx de lucro!!!
- Diminuição da tx lucro e perspectivas de negócios;

(2)
Restrição: caráter extensivo da acumulação, próprio ao crescimento de qualquer economia mercantil-escravista;
Novas terras = interiorização = elevação dos preços dos transportes = queda tx de lucro.
Fertilidade das terras do oeste paulista garantiria cobertura dos custos só temporariamente.
“Enquanto os limites fossem móveis, os empresários cafeeiros adotariam técnicas predatórias de cultuvo, evitando despesas desnecessárias” 67

(3)
Períodos: da generalização e da post-generalização.
-Generalização: inevitável queda dos $s para inserção do produto
-Post-generalização: apenas delimitação de limite superior para $s imposto pela concorrência de substitutos quase-perfeitos (chá), concorrência com outros produtores e se transformar em produto-sobremesa e não mais parte da cesta de consumo popular;

Origens dos movimentos oscilatórios dos $s:
1)    Cultura cafeeira e maturação;
2)    Condição de demanda externa;
3)    Fatores naturais;
Oscilações tendem a um caráter cíclico influenciado pela demanda externa, coeficientes de importação, taxa de câmbio, capacidade produtiva...

“Conclui-se, portanto, que os preços internacionais não suportariam o peso de fator compensatório à elevação de custos provocada tanto pelo crescimento das despesas do transporte, quanto pela subida de preços dos escravos” (69): pq na generalização os preços tendiam a cair e na post-gener não haveria altas <<ou seja, cafeicultores não poderiam se apoiar na demanda para ampliar a oferta>>
Portanto, barreiras: terras, transportes e escravos.

Problemas do financiamento, JMCM cita Franco (1969): comissários financiavam e geriam os investimentos, ou seja, eles empregavam seus Ks de maneira direta na produção. Eles controlavam financiamentos e vendas, pontos extremos do movimento do capital no processo de produção. Sobre a citação, JMCM diz: “O capital mercantil continua a dominar a agora economia nacional, através da ação do comissário, que alcança seu auge em 1850, depois compartilhada pelos grandes “bancos cafeeiros” que começam a se formar desde então” (71)
<<PROVA: qual o papel do capital mercantil na gênese do capitalismo brasileiro? JMCM mostra que, depois de esse K ter se inserido na esfera produtiva e criado a empresa exportadora de produtos coloniais, ele continua exercendo sua forte influencia agora por meio dos comissários que controlam internamente o dinherio externo regulando, como torneiras, as quantidades de K investidos e até canalizando a valorização realizada no final do ciclo produtivo, depois da venda da mercadoria>>
“Desaparecera o monopólio do comércio colonial, que conseguia reduzir os lucros retidos pelo setor produtor a quase nada, fixando os preços de compra dos produtos coloniais e os preços de venda dos produtos metropolitanos. Surgira em seu lugar o oligopsônio comercial e o oligopólio financeiro, que, manipulando os preços de compra e fixando exorbitantes taxas de juros, terminaram por conduzir ao mesmo resultado, à dominação do capital mercantil” (72)
Movimentos da economia cafeeira:
- 1810 a 1850: constituição, consolidação e generalização permitindo baixa de $s internacionais por conta de oferta abundante de terras no Vale do Paraíba, perto do porto (= -custos transportes), persistência do tráfico de negros. Lucros foram garantidos pelo cultivo predatório da terra e da taxa de exploração do escravo;
- 1857: subida dos $s providencial para a expansão desta economia contrabalançou aumentos dos custos;
- 1863: $s deprimem-se, estancam expansão;
- 1868 - 1875: produção mundial reduz por conta de fatores naturais = subida dos $s
* Limitações e problemas: transportes (escravo-força animal) e seus altos fretes + carência de trabalho escravo a preços lucrativos.
- final dos anos da década de 1860: crise da economia mercantil-escravista cafeeira = crise da economia colonial.
1.2.3 O momento da crise da economia colonial e a emergência do trabalho assalariado
Ausência de indústria não pode ser atribuída à falta de proteção. Havia protecionismo: em 1844 foi decretada a Tarifa Alves Branco, tributação em 30% da maioria dos artigos.
* Indústria escravista:
- custos superiores pq pagamento é adiantado no caso do escravo e rotação do K fixo (escravo) é lenta;
- condições de trabalho: coação vs. retribuição;
- produtividades diferentes;
- despesas com trabalho de vigilância;
- progresso técnico excluído dessa indústria escravista pq sucatearia seu ativo (escravo) em detrimento de novas máquinas;
- caráter antiprogressista (escravos) vs progressista (Klismo)
Conclusão: “A crise da economia mercantil-escravista nacional não encontraria qualquer saída mantendo-se escravista e mercantil” (80) !!
Razão fundamental para o bloqueio da industrialização capitalista: “Há homens, mas o mercado de trabalho está vazio, porque os homens, em quantidade superabundante, não podem ser submetidos pelo capital. (...) Em suma, a própria agricultura escravista de exportação colocava os homens livres e pobres à margem, porque dispensáveis, mas, ao mesmo tempo, não os deixava à disposição do capital, como força de trabalho passível de se transformar em mercadoria, desde que a eles era permitido produzirem sua própria subsistência” (81) <<PROVA>>
Era preciso haver expropriação: “Não havendo condições para a transformação da força de trabalho em mercadoria, pré-requisito indispensável, estaria bloqueada a industrialização capitalista” (83) <<essa medida foi necessária pq aqui não houve a mesma crise do feudalismo que desligou o homem de seus meios de produção forçando-os a se tornarem mercadorias depois dos cercamentos >>.
* Motivos do avanço:
1) estrada de ferro comandada pelo K mercantil nacional e apoiada pelo K financeiro inglês, tornado possível e estimulado pelo Estado;
Emília Viotti (1966): rapidez comunicação, maior capacidade de transporte, baixos fretes, melhor conservação do produto = preços mais altos no comex, mais lucros e “novas perspectivas para o trabalho assalariado”
2) maquinização na grande indústria do beneficiamento: poupa trabalho escravo e melhora qualidade = $s maiores;
1 + 2 reforçam a economia mercantil-escravista cafeeira nacional e criam condições para o trabalho assalariado ao mesmo tempo.
Estes pontos estimularam a acumulação, mas ela esbarrava na falta de braços. “prosseguindo, a acumulação haveria de ser cada vez mais entravada. Em outras palavras, não é preciso que o escravismo se desintegre, porque não ofereça nenhuma rentabilidade às empresas existentes; para ser colocado em xeque, basta que se obste a acumulação” (87).




Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil

SILVA, Sérgio. Expansão cafeeira e origens da indústria no Brasil
Capítulo II Condições históricas da expansão cafeeira
1.                  Condições externas
Segunda metade século XIX, crescimento grande do comércio mundial – influência nos países onde Klismo não era desenvolvido, cria condições para o Klismo. Cotações de café apresentam alta a partir de 1850.
1.1.            Do mercado mundial à exportação de capitais
SS cita Marx sobre a importância do comércio para desenvolvimento do Klismo, que diz que o comercio é uma “condição histórica para o desenvolvimento do capitalismo”.
São condições históricas para mudanças nas relações internacionais também no mesmo período: “A passagem do capitalismo a um estágio superior do seu desenvolvimento, se caracteriza precisamente, nesse nível de análise, pelo papel dominante que a partir dessa época passa a ser desempenhado pelas exportações de capitais” (24)
Diferença entre crescimento do comércio e crescimento das exportações de capitais está na natureza das relações econômicas internacionais, pq quando essas exportações de Ks se tornam dominantes, o desenvolvimento da produção capitalista realiza-se em escala mundial.
Influência externa na evolução econômica dos países.Comércio não muda as relações de produção.
“A partir da segunda metade do século XIX, o capital não se limita mais, ao nível internacional, à troca de produtos; ele se apropria da própria produção ao nível mundial. A partir desse momento, o desenvolvimento do comércio internacional torna-se apenas uma parte (aspecto subordinado) do desenvolvimento capitalista (da produção capitalista) em escala internacional” (25)
Exportações de K não podem ser analisadas apenas no nível contábil pq SS considera K como uma “!relação social que pode assumir diferentes formas” (25). Contabilmente o movimento [1]não é levado em consideração e tende a desaparecer. É preciso deslocar a análise para a reprodução do capital.
“o caso dos empréstimos públicos, uma das primeiras formas de exportação de capitais e a forma dominante no Brasil durante o período que estudamos” Por conta do serviço da dívida, há a discussão de que foi o Brasil que mais exportou capitais, mas essa visão, mais uma vez, não analisa o movimento do capital.
“Na verdade, esses empréstimos serviam, direta ou indiretamente, para o financiamento da imigração massiva de trabalhadores – e, portanto, para a organização do mercado de trabalho no Brasil –, para a construção de numerosas estradas de ferro, para a implantação de vários outros serviços públicos e industriais, tais como a eletricidade, o gás, os transportes urbanos etc., sem falar na própria construção e consolidação do Estado” (p. 28)



2.                  Condições internas
- Br e Argentina receberam 60% dos investimentos britânicos na América Latina – argumento para o fato de o desenvolvimento dos capitalismos nacionais ser desigual entre países;
2.1.            Capital
- abertura dos portos às nações amigas e transformação do Br em Reino Unido de Port e Algarves dão autonomia ao país;
“O processo que conduz à independência do Brasil está inserido em um quadro internacional preciso, caracterizado, fundamentalmente, pela revolução industrial, pela decadência do capital mercantil, pela ascensão das potências industriais, como a Inglaterra, e em particular pela crise do antigo sistema colonial português” (p. 34)

- Abertura dos portos e independência política possibilitaram o acesso da burguesia comercial brasileira ao setor central dessa economia ainda colonial, ou seja, o setor mercantil. “a partir dessas datas, a burguesia comercial brasileira desenvolve-se rapidamente graças, sobretudo, à consolidação e expansão das fazendas de café, que essa burguesia organiza juntamente com a aristocracia fundiária local” (34)

Primeira metade sec XIX: fazendas com trabalho escravo. Escravos eram comprados do NE e sobretudo Minas, graças ao declínio das atividades das minas de ouro; mas ainda, nesse começo de século; a África foi importante fornecedora de escravos (SS cita Furtado) – importante pq a pop de escravos nacional decrescia por conta da alta explotação (tbm apontada por Furtado, mas não citado diretamente por SS).
Essa organização garante que em 1840 o café seja responsável por 40% das exportações brasileiras. “Em consequência, na década de 1860 já existe no Brasil uma classe de capitalistas comerciais bastante rica para aproveitar as condições favoráveis do mercado internacional” (34)

2.2.  Força de trabalho
Expansão com base no trabalho escravo era escassa. Apesar das interdições do tráfico, a produção continuava apoiada no trabalho escravo.
Onde não havia escravos, o sistema de trabalho retia o trabalhador à terra, os “camponeses brasileiros”, em geral no interior do país, onde a pecuária e a agricultura eram organizadas na forma de latifúndios – sistema apoiado na auto-subsistência. “A inexistência de uma rede de comunicação ligando as diferentes regiões do Brasil e a dispersão dos latifúndios, reforçavam os laços entre os trabalhadores e o latifúndio” (p. 36). Portanto, mesmo sem ter terra nenhuma e depender do dono do latifúndio para ter um espaço para cultivar bens para sua subsistência, esses trabalhadores não constituíam um verdadeiro mercado de trabalho.
Pequenos proprietários eram encontrados em regiões meridionais, atingidas pela imigração europeia estimulada após a Independência. Também eram isolados e viviam da auto-subsistência.
Imigrações:
- 1850, primeiras experiências:fazendeiros obtiam financiamento com o Estado e imigrantes se comprometiam a reembolsar os fazendeiros com o trabalho futuro; Esse sistema de quase escravidão entravou as imigrações quando ficou conhecida na Europa. “Foram necessários mais de 10 anos para que os fazendeiros de café, obrigados pelas exigências da acumulação de capital, se decidissem a abandonar seus métodos pré-capitalistas e oferecer aos trabalhadores condições de trabalho baseadas em contratos salariais, facilitando assim a imigração” (p. 37).
Imigrantes são encontrados, principalmente, no sul da Itália que passava por um momento complicado após a Unificação Nacional.Nos dois últimos decênios do século XIX, os italianos foram a grande maioria (65%) de imigrantes vindos para o Brasil.
-1870 após essa década o governo de SP passa a tomar conta das imigrações e seus custos.
-1880 imigração se torna massiva: entre 1887 e 89 1.300.000 imigrantes chegaram ao Brasil;
“Foi fundamentalmente graças a essa imigração massiva de trabalhadores de origem europeia que o mercado de trabalho formou-se e desenvolveu-se no Brasil até a década de 1920. E nesse mercado de trabalho, formado pelos trabalhadores imigrados, se abasteceram não somente os fazendeiros de café, mas também os primeiros industriais brasileiros” (p. 38)

2.2.1. Efeitos contraditórios da abolição progressiva
A abolição sofreu golpes do Governo do Império (lei do sexagenário e a lei do ventre livre)e seguiu o desenvolvimento do mercado de trabalho.
“Nem a abolição progressiva da escravidão nem mesmo sua proibição total em 1888 foram suficientes para assegurar o rápido desenvolvimento do mercado de trabalho. Isso deve ser explicado fundamentalmente por razões ideológicas, ligadas a um certo estágio de desenvolvimento do capital” (p. 39)
SS fala da adaptação dos trabalhadores e cita Furtado para falar da “abolição progressiva” e o fato de a abolição ser mais uma medida política que econômica, uma vez que não provocou uma modificação na forma de produção. “O capital já domina a economia colonial. Trata-se, portanto, de uma passagem a novas formas de dominação do capital. A especificidade dessa passagem consiste na necessidade da destruição das relações de produção escravistas, em lugar da sua simples subordinação” (p. 40). A abolição progressiva precisaria de uma introdução progressiva de trabalho assalariado – por isso, quando as classes dominantes ao defenderem as antigas formas de dominação como uma forma de acumulação elas só atrasavam a acumulação.
Capítulo III Economia cafeeira
O café se torna “o centro motor do desenvolvimento do capitalismo” no Brasil a partir de 1880 quando a produção média anual chega a 5 milhões de sacas. O centro das plantações se desloca para os planaltos de São Paulo. Junto dessa mudança geográfica, há também outros pontos positivos levantados pela economia cafeeira: a substituição do trabalho escravo pelo trabalho assalariado, a mecanização do beneficiamento do café e as estradas de ferro formando uma rede de comunicação que juntos do financiamento e comercialização do produto forma um sistema comercial avançado com casas de exportação e rede bancária.
1.       Plantações
1.1   Trabalho assalariado
2/3 imigrantes chegados a SP são empregados nas plantações com contrato de trabalho com aviso prévio de um mês – SS não cita, mas esse direito garantido para os donos das fazendas principalmente por conta da instabilidade destes trabalhadores que se libertavam muito facilmente da terra depois de findados os 12 meses de contrato. Contrato tinha salário base proporcional ao número de pés atribuídos a cada trabalhador, o preço do salário era fixado no contrato. Além do dinheiro, o imigrante recebia um pedaço de terra que podia cultivar por conta própria, mas só produtos permitidos em contrato, em geral milho, mandioca e feijão preto. Apesar de ser para subsistência, em bons anos os trabalhadores vendiam o excedente no mercado. Essas culturas eram intercaladas, dentro da fazenda – assim os trabalhadores mantinham as duas culturas. Com o envelhecimento das plantações e o aumento da produção, as culturas intercaladas ficaram cada vez mais raras enquanto a exploração do trabalhador aumentava.
O desenvolvimento das estradas de ferro aumenta a imigração de brasileiros. Vindos de Minas  e também da Bahia a procura de trabalho em São Paulo, esses trabalhadores deram a oportunidade aos fazendeiros para baixar os salários nas plantações.
Com o fim das colheitas, havia um deslocamento de trabalhadores agrícolas. Devido às instabilidades dentro da lavoura, com crises, greves e conflitos com o donos das fazendas,  imigrantes se mudavam para outras terras, para a Argentina ou tinham esperança de voltar para a Europa. Sérgio Silva cita Dennis que caracteriza os colonos como nômades e diz que 2/3 das famílias desloca-se de ano em ano. Silva analisa:
“Ao examinar esse problema da indústria cafeeira, Dennis não leva em consideração o fato de que essa indústria é em grande parte o resultado da luta de trabalhadores que não aceitavam passivamente as condições de trabalho impostas pelos fazendeiros. Mesmo a mecanização parcial das fazendas não pode ser explicada se não considerarmos essa luta (nas formas mais diversas) entre o capital e os trabalhadores agrícolas” (p. 48) Visão social!!!

1.2   Mecanização
Mecanização das operações de beneficiamento substituindo o uso da madeira e da água pelo metal e o vapor. A importância dessas inovações está tanto na economia de mão de obra quanto na possibilidade de estabelecimento de novas plantações mais distantes e como um instrumento da indústria cafeeira.

1.3   Estradas de ferro
Primeira: Sociedade de Estradas de Ferro Pedro II, organizada pelo Governo do Império – Norte de SP e sudeste de MG;
Segunda: Santos-SP, construída pela São Paulo Railway Co. Ltd., organizada na Grã-Bretanha; ficou pronta em 1867;
Outras: Paulista, Sorocabana e a Mogiana, organizadas pelo capital cafeeiro brasileiro e os acionistas eram os próprios fazendeiros. A Paulista por fazendeiros de Campinas, Rio Claro, Limeira e Araras;
1908, a companhia Paulista, administrava 1.100 km de vias férreas
“Com o rápido desenvolvimento da rede de estradas de ferro brasileira a partir de 1860 constiui-se uma infra-estrutura necessária ao desenvolvimento do capitalismo, em particular na região cafeeira” (p. 52)
2.       Capital cafeeiro
“Desde o começo, os principais líderes da marcha pioneira não se limitam a organizar e dirigir plantações de café. Eles eram também compradores da produção do conjunto de proprietários de terra. Eles exerciam as funções de um banco, financiando o estabelecimento de novas plantações ou a modernização de seu equipamento, emprestando aos fazendeiros em dificuldade” (p. 53) A gestão das plantações passa para administradores e os fazendeiros ficam mais próximos aos centros de negócios cafeeiros, perto das casas de exportação que adquire papel importante com o desenvolvimento da economia cafeeira.
2.1. Diversos aspectos e aspectos dominante do capital cafeeiro

K cafeeiro = K agrário + industrial + bancário + comercial, devido às diferentes funções que esse K tem no desenvolvimento do capitalismo atribuídas à burguesia cafeeira.

K cafeeiro é predominantemente comercial dividido em duas frações: grandes e médios capitais. “O capital cafeeiro representa a unidade dos dois, sob dominação do primeiro” (55)
- Grandes Ks: camada superior da burguesia cafeeira = burguesia comercial
- Médios Ks: camada inferior da burguesia = burguesia agrária, uma simples classe proprietária de terras.
Os Ks não existem de maneira autônoma e “A preponderância do capital comercial é, em primeiro lugar, o resultado do desenvolvimento ainda fraco das relações de produção capitalistas no Brasil” (55), ele domina a produção (ponto em comum com JMCM?), por isso Silva afirma que a acumulação brasileira se dá no nível do comércio, o que dá um ritmo lento para o desenvolvimento das forças produtivas (PQ????)
Além disso, a dominação do capital comercial explica-se por ser o Brasil um país primário-exportador e dependente em relação ao comércio mundia.

3.       Desenvolvimento da Economia cafeeira no início do século XX

3.1. Superprodução

1882: produção ultrapassa a mundial
1893: Crise nos Estados Unidos, principal consumidor do café brasileiro, faz preços cair

Política inflacionária + rápida desvalorização da moeda brasileira. “De um lado ela (a política inflacionária) acarretava o aumento dos preços dos produtos importados e portanto, nas condições da economia brasileira da época, uma alta geral do custo de vida. Em consequência, a burguesia cafeeira encontrava a oposição de todas as outras classes que não a burguesia agrário-exportadora, desde os importadores aos trabalhadores, passando em particular pela pequena-burguesia urbana.” (p.57).
+serviço da dívida encarecia;

3.2. Valorização

No início de fev/1906 - Taubaté e a politica de defesa do café que previa a compra do excedente pelo governo, financiamento dessas compras com recursos estrangeiros, novo imposto sobre exportação do café para pagar o serviço dos empréstimos estrangeiros e medidas para desencorajar as plantações.

Constituição de 1889 (citada por Florestan Fernandes como um instrumento de legitimação do poder da burguesia) dá autonomia aos Estados e os cafeicultores de SP tomam suas medidas através do governo deste estado. Foi uma imposição para o Brasil de uma política definida em Taubaté:

“A burguesia cafeeira mostrava assim ao governo central e ao conjunto das classes dirigentes, a sua rigidez quando se tratava de seus interesses fundamentais. Nesses casos, o governo central deveria segui-la. Ela afirmava assim, muito claramente, o seu papel hegemônico no seio das classes dominantes”  (p. 61)

“Na medida em que assegurou a continuação da acumulação na economia cafeeira, que era o núcleo do desenvolvimento capitalista no Brasil, a ‘valorização’ tem como resultado principal o prosseguimento do desenvolvimento capitalista” (p. 61)
Ao mesmo tempo, o K estrangeiro se torna dominante ao nível da comercialização do café e desenvolvem-se bancos e casas de exportação pertencentes à burguesia nacional.

A valorização é o apogeu do período: “parece-me errado ver nessa política um simples adiamento do fim da dominação da economia cafeeira sobre o conjunto da economia. Ela não constitui o começo do fim desse período senão na medida em que representa, de certa maneira, o seu estágio supremo. É necessário jamais perder de vista que, com a ‘valorização’, o capital estrangeiro e o capital cafeeiro tomam suas formas definitivas durante esse período” (p.63)

“A ‘valorização’ e a economia cafeeira em geral não podem ser considerados como um obstáculo ao desenvolvimento do capitalismo no Brasil. Bem ao contrário, eles estão na base desse desenvolvimento. Mas a presença do capital estrangeiro e do capital cafeeiro, quer dizer as formas específicas de dominação imperialista no Brasil dessa época, ou ainda as relações especificas das quais essas formas são a expressão, determinam contradições elas também específicas ao desenvolvimento do capitalismo no Brasil” (p.63)

4.       A questão da terra e da abundância de terras

Dois tipos de terra onde está o café: terras com (propriedades) e sem proprietários (devolutas) – são ponto de partida da expansão capitalista baseada no café.
A proporção de terras devolutas torna-se maior a medida que o café avança para Oesta paulista e os fazendeiros adquiriam a posse dos espaços expulsando violentamente os ocupantes (imigrantes europeus, indígenas. A dominação do capital sempre ganhava quer seja comprando as terras com proprietários, quer seja com a integração desses proprietários às grandes fazendas, ou mesmo com a posse das devolutas.

“Se a massa de imigrantes pudesse ter acesso fácil à propriedade da terra, o capital não encontraria a força de trabalho que tanto precisava. O preço elevado da terra na região do café reflete a apropriação da terra pelo capital” (66)

Abundncia de terras é relativo como fator de expansão do café: “à abundância de terras para o capital está associada a não abundância para aqueles que devem constituir o mercado de trabalho” (67)

“Assim, nas fases iniciais do capitalismo não basta a disponibilidade de terras em geral, mas a disponibilidade de terras em particular para o capital, o que implica a não disponibilidade para os trabalhadores” (67)

Segundo aspecto: Ausência de determinantes sociais na questão da abundância de terras. Mesmo analisando a não abundância para o trabalhador, a questão ainda é puramente relacionada apenas à quantidade.
O desenvolvimento da produção depende da divisão internacional do trabalho: “Podemos afirmar que o marco de referência da acumulação de capital não está mais essencialmente no desenvolvimento do mercado interno, mas no desenvolvimento do mercado mundial. Com a seguinte ressalva: como já vimos anteriormente, o próprio desenvolvimento do mercado mundial capitalista entra em nova fase, com a constituição da economia mundial, isto é, com o desenvolvimento da produção capitalista em escala mundial. E o que nos interessa aqui não é o simples desenvolvimento do mercado, por mais importante que seja, mas especificamente a expansão do espaço sobre o qual se desenvolve a produção capitalista” (69)
- é da transformação do capitalismo e da economia mundial capitalista que resulta a questão da abundância de terras.




[1] Explicação de SS para movimentos na nota de rodapé nº8: “Por movimento de capital entendemos o conjunto do processo de reprodução do capital, que inclui não somente a circulação mas ainda os processos de produção e distribuição” (p. 27) 

Fichamento Florestan FERNANDES, cap 1

A longo prazo em qualquer nível ou esfera em que ocorresse estruturalmente, a integração nacional produzia efeitos que ultrapassavam o mero despojamento dos caracteres geteronômicos da antiga ordem social, conduzindo de fato à sua desagragação e à intensificação concomitante da formação de caracteres autonômicos típicos de uma sociedade nacional (33)

Dois aspectos:  I. maior envolvimento das elites rurais para a formação de uma economia nacional - absorção do liberalismo ideologia ligada ao processo de consciência social vinculado à emancipação colonial. Num cenário onde a elite se sentia “esbulhada” (explorada) pela colônia, o liberalismo obteve duas funções típicas: preencher a função de dar forma às manifestações contra o “esbulho nacional” propondo igualdade por meio da “emancipação dos estamentos senhoriais das limitações oriundas do estatuto colonial e das formas de apropriação colonial”; do outro lado teve a função de “redefinir (...) as relações de dependência que continuariam a vigorar na vinculação do Brasil com o mercado externo e as grandes potências da época” (34) “No fundo, porém, apenas encobria, através de ficções toleráveis, diversas modalidades evidentes de subordinação, que não seriam suprimidas nem alteradas, fundamentalmente, com a extinção do estatuto colonial” (34)
II. construção de um Estado Nacional: o Estado era meio para realizar a internalização dos centros de decusão política e fim porque afirmava e institucionalizava o predomínio político das elites e dos interesses internos. Liberalismo com nítido caráter intrumental.
“O Estado impôes-se como a única entidade que podia ser manipulável desde o início, a partir da stuação de interesses das elites nativas mas com vistas a sua progressiva adaptação à filosofia política do liberalismo”” (35)
O liberalismo, portanto, contribuiu para orientar o desenvolvimento da sociedade nacional uma vez que os senhores rurais precisaram aprender a tomar suas decições independentes do nexo colonial que os subordinava, porém, a estrutura criada continua ser, como Florestan Fernandes define, “heteronômica” ou dependente. Isso tudo sem afetar a vida social, a escravidão e a forma tradicional de dominação patrimonialista.

“Os antigos modelos patrimonialistas coninuaram a ter plena vigência ao nível do domínio senhorial propriamente dito (ou seja, da organização da economia escravista e das estruturas sociais que lege serviam de base) e, como irradiações locaos oiu regionais, ao nível das relações sujeitas ao prestígio pessoal dos senhores e ao poder de mando das grandes parentelas. Todavia, a organização do “poder central” fopi colocada num plano independente e superior, no qual aqueles models de domunicação se faziam sentir apenas de maneira indireta e condicionante (principalmente através de controles sociais reativos, que se vinculabam às opções feitas pelos representantes dos estamentos senhoriais no exercício do poder político). Estabeleceu-se, assim, uma dualidade estrutural entre as formas de dominação sagradas pela tradição e as formas de poder criadas pela ordem legal. (...) compelia as capamadas senhoriais a organizar sua domuniação especificamente política através da ordem legal, ao mesmo tempo que conferia ao “poder central” meios para impor-se e para superar, fradualmente, o impacto sufocante do patrimonialismo.” (37)

Portanto, sem perder-se de vista as limitações e deformações que sofreu numa sociedade e numa cultura tão avessas às suas implicações sócio-econômicas, políticas, intelectuais e humanitárias, e acentando-se que, ainda assim, ele só se constituiu em realidade histórica para as minorias atuantes dos estamentos senhoriais, o liberalismo foi a força cultural viva da revolução nacional brasileira. (38)

ideoligia liberal se equacionou historicamente, acima de tudo, como uma ideologia da emancipação dos elementos senhoriais da “tutela colonial” e só derivadamente, como interferencia inevitável, ela assumiu o caráter de uma ideologia de emancipação nacional.

“Graças à essa transformação, o elemento senhorial volta ao centro do palco, agora transfigurado em “cidadão”, que era no que o convertia, para os fins da organização do poder político, a ordem legal vigente. Assim, a ideologia liberal, inócua e excluída ao nível da dominação patrimonialista (pela persistência concomitante da escravidão, do mandonismo, do privatismo e do localismo), encontra na sociedade civil, nascida da Independência, uma esfera na qual se afirma e dentro da qual preenche sua função típica de transcender e negar a ordem existente” 39

Foi preciso uma dinamização das polarizações ideológicas e utópicas do liberalismo por meiode requisitos estruturais e funcionais de ordem legal (ou seja, constituição de 1824).”liberalismo adquire a qualidade e a continuidade de força politica permanente, embora sua influencia tópica fosse variável. (...) As normas constitucionais que regulavam os direitos de escolha e de representação, através de eleições primárias e das eleições indiretas bem como o poder de decisão inerente aos diferentes mandatos eletivos e a possibilidade aberta ao poder moderador de recrutar ministros e conselheiros de Estado entre deputados e senadores condicionavam uma tal concentração do poder político ao nível de privilégios senhoriais, que “sociedade civil” e “estamentos sociais dominantes” passaram a ser a mesma coisa.” (p. 40)

a chamada “massa dos cidadãos ativos” servia de pedestal e de instrumento aos “cidadãos prestantes”, a verdadeira nata e os autênticos donos do poder naquela sociedade civil.

Em que sentido a revolução política da Independência foi legitima? Legitimidade diz respeto a meridos ou fundamentos de uma posição privilegiada... foi legitimo porque a elite senhorial conseguiu assumir controle da ordem legal e dar rumo à constituição da sociedade civil? Que sociedade civil é esta que foi constituida?

Mudanças de estrutura (quando comparado a sociedade colonial com a imperial) em três níveis:
1) diferenciação dos papéis políticos do senhor, que se metamorfoseia em senhor-cidadão - significado estrutural-funcional: as probabilidades de mando do senhor, pela primeira vez, transcendem aos limites do domínio senhorial e alcançam o poder político especificamente falando;
2) formas de socialização que converteram privilégios sociais comuns em fonte de solidariedade social e de associação política. fica evidente a necessidade de integração a visão de mundo daqueles senhores que estavam organizados estamentalmente, sem relações com outros agentes. “A dominação senhorial alcança, dessa maneira, as formas de poder político da sociedade ‘nacional’ e passa a ser um dos fatoress mais importantes da integração de sua ordem social. Ele se transforma, portanto, em dominação estamental propriamente dita” (p. 42)
3)redução do espaço social dentro do qual as garantias sociais estabelecidas legalmente podiam e deviam ter vigência ou eficácia. “O liberalismo também se convertia em privilégio social. Ele fazia parte de concepções e ideais que se aplicavam a ‘relações entre iguais’ e, por isso, ficava confinado à convivência e ao destino dos membros dos estamentos dominantes” (p. 42)

Limitações histórico-sociais da revolução da Independência: impôs o império da dominação senhorial; mostra o caráter dúplice do liberalismo <”Representava a via pela qual se restabeleceriam, encoberta mas necessariamente, os nexos de dependência em relação ao exterior; desvendava o caminho da autonomia e da supremacia não de um Povo, mas de uma pequena parte dele, que lograra privilegiar seu prestígio social e apossar-se do controle do destino da coletividade. Todavia, ao lado desses aspectos sombrios, o retrato mostra a dignidade histórico-sociológica da Independência, como revolução política e social, e as funções construtivas do liberalismo” (43)

Sociedade civil é sociedade e nação para o senhor-cidadão
A democracia não era uma condição geral da sociedade. Porém, necessidade e recurso do equilíbrio, eficácia e continuidade da dominação estamental. O debate democrático tinha por fim estabelecer os limites de acordo (ou de desacordo) e as linhas possíveis de solução (ou de omissão) recomendáveis, suscetíveis de merecer a aprovação ou de obter o consentimento dos “cidadãos prestantes” e da parte socialmente válida dos “cidadãos ativos”. Por essa razão, a sociedade civil constituía o ponto de referência do debate político e encarnava, em última instância, o árbrito figurado que iria julgar ou estaria julgando o mérito das decisões” (44)

“a ordem legal perdia sua eficácia onde ou quando colidisse com os interesses gerais dos estamentos senhoriais e sua importância para a integração jurídico-política da sociedade nacional passou a depender do modo pelo qual aqueles interesses filtravam ou correspondiam às formas de poder político instituídas legalmente” (. 44)

Nação - interesses gerais dos estamentos senhoriais;
sociedade civil - formas de organização do poder político instituídas legalmente

Para objetivar-se e agir politicamente, no patrocínio de seus “interesses gerais”, os estamentos dominantes precisavam do aparato administrativo, policial, militar, jurídico e político inerente à ordem legal. E precisavam dele não privada e localmente, mas no âmbito da Nação como um todo (p. 45)

Sem dúvida, nenhuma revolução sepulta todo o passado de um Povo. Uma revolução que adquiriu conteúdo e consequências sociais por sua natureza política, estava dasada a projetar antigas estruturas sociais e um novo contexto político (p 46)
O liberalismo era força para sepultar o passado
Estado preenchia duas funções: 1) manter estruturas sociais para levá-las ao monopólio social do poder político; 2)expandir ou fomentar variáveis que formariam a sociedade nacional;

A estrutura do patrimonialismo permanecia a mesma, pois continuava a manter-se sobre a escravidão e a dominiação tradicional; O aparecimento de um estado nacional, a burocratização da dominação senhorial ao nível político e a expansão econômica subsequênte à Abertura dos portos colocavam em novas bases, contudo, as funções econômicas e sociais dos estamentos intermediários e superiores. 47

É esta área, ao mesmo tempo emaranhadamente ligada aos interesses senhoriais mas dinamicamente incompativel com seus modelos tradicionais ou políticos de dominação, que compeliu as elites no poder a superporem, à ordem tradicional vigente nos costumes e fortalecida pelos efeitos políticos conservadores da burocratização da dominação estamental, uma ordem contratual que se impunha pela nova posição do Brasil no sistema internacional do capitalismo comercial 48

liberalismo se impunha como um “momento de vontade indecisa”

expansão interna do capitalismo não foi uma escolha, no sentido literal, já que decorria de uma posição prévia do brasil na economia internacional, ela trazia consigo um presente e, com ele, um futuro. 49

conclusões das relações de expansão do Klismo: 1)motivações ideológicas do liberalismo eram primariamente econômicas e a penas implicitamente políticas; as utópicas eram diretamente políticas e só secundariamente econômicas - o que estava em jogo era a utopia; 2)realismo conservador e idealismo liberal são faces da mesma moeda; faziam parte da manutenção do monopólio social do poder político; 3) integração da sociedade nacional como idealismo politico

O País possuía, graças ao desenvolvimento sócio-econômico no período colonial e ao legado portugês, alguma unidade interna e fortes tendências para preservá-la. 50

Elites: 1) contavam com cultivo intelectual segundo padrões europeus; 2) tinham experiência politico-administrativa; 3) inconformismo irredutivel com independencia e construção do estado monarquico e realismo insofreável quanto à escravidão; 4) liderança; 5)diferenciação interna (52)

Esse aspecto dos dinamismos psicossiciais subjacentes à socialização das elites senhoriais é de extrema significação analítica, porque indica com clareza que a polarização nacional da dominação estamental rompeu, no plano político, os bloqueios que continuaram a prevalecer, indefinida e progundamente, ao nível doméstico, da unidade de produção e do mandonismo local. 53

não seria possível extinguir o estatuto colonial semn construir-se uma sociedade nacional; também não era possível a nova sociedade sem herdar dminensões da antiga ordem colonial.
- “A composição ou o amálgama com o passado possuía, portanto, cissuras e ‘avanços para a frente’ que não podem ser ignorados e que precisam, ao contrário, de uma compreensão que ponha em relevo os papéis construtivos logrados pelo ‘presente’, pelo ‘futuro’ e pelo ‘progresso’ nos processos perceptivos, cognitivos e pragmáticos dos agentes humanos, socialmente atuantes. “ (54)

Graças e através da Independência, Nação e Estado nacional independente passaram a ser ‘meios’ para a burocratização da dominação patrimonialista e, o que é mais importante, para a sua transformação concomitante em dominação estamental típica (55)

O desenvolvimento prévio da sociedade, sob o regime colonial, não criara, por sim mesmo, uma Nação. Mas dera origem a estamentos em condições economicas, sociais e politicas de indentificar o seu destino histórico com esse processo. 55

Funções inovadoras do momento da independencia: “transformação do horizonte cultural das camadas dirigentes; a reorganização do fluxo de renda e do sistema econômico; o aparecimento e a intensificação de mecanismos permanentes de absorção cultural; e a emergência da política econômicaI  como dimensão técnica da burocratização da dominação estamental” 56

Estamentos senhoriais não podiam exercer seu poder na colonia porque estavam submetidos à Coroa; só com o Estado nacional independente permitia essa “auto-realização” e a “expansão do patrimonialismo doméstico”

estamentos senhoriais reagem à nova situação assumindo novos papéis políticos na esfera da organização do poder

“...a implantação de um Estado nacional independente não nasceu de nem correspondeu a mudanças reais na organização das relações de produção” 61

A persistência de estruturas econômicas coloniais foi limitativa, sem dúvida, já que impediu qualquer mudança na concentração social da renda e qualquer correção de suas distorções. (...) Como os processos econômicos mais significativos para o crescimento ulterior se desenrolavam como consequência das transformações no modo de ordenar, dirigir e explorar os fatores econômicos (efeitos econômicos de um processo político: a grande lavoura libera-se dos entraves resultantes do estatuto colonial e organiza-se como força econômica), as alterações estruturais e dinâmicas mais relevantes ocorrem ao nível da reorganização do fluxo da renda e do seu impacto sobre a economia interna. 62

O país livrou-se da condição legal de Colônia, mas continuou sujeito a uma situação de extrema e irredutível heteronomia econômica. 62

Mesmo desaparecendo “os focos da heteronomia” economica na era colonial, ela foi substituida por novas formas. O fluxo de renda deixou de ser canalizado para fora e ganhou suporte social interno pelos senhores das lavouras e depois do comércio. “1º) a internalização do fluxo de renda forçou, de modo direto, a diferenciação dos papéis econômicos; 2º) ela também contribuiu para modificar a composição do sistema econômico” 63

Repercussões das transformações: I) liberaram comportamentos capitalistas antes sufocados pelo colonialismo; II) novas bases para a economia de mercado interna com novos e diferenciados consumidores e tbm pela especialização; III) recalibração econômica do comércio; 64

Reorganização interna do fluxo de renda faz senhores rurais ficarem competitivos entre si e com outros agentes econômicos; convertiam-se em agentes de transações comerciais, mas ainda viam na terra a fonte de riqueza e futuro da nação.

Problemas fundamentais tendo em vista a autonomização política como um complexo processo histórico-social:

1) aonomização é política. não houve revolução das relações de produção, mas sim preservação e fortalecimento das relações na grande lavoura. “O paradoxo está no fato de que a revolução nacional não resultou de uma recolução economica nem concorreu para forjar ideais de autonomia econômica que implicassem ruptura imediata, irreversível e total com o passado recente. Antes, consolidou e revitalizou as funções da grande lavoura, como pólo dinâmico da economia interna, servindo de base à referida expansão limite das estruturas econômicas coloniais” (72)

2) evolução histórica explica-se por questões internas. O mercado externo e o sistema internacional de poder só pressionam para o fim do estatuto colonial e se interessa pela autonomização política mantendo-se demais condições econômicas para garantir oferta de fatores de produção.


“imperativo histórico” - senhores usam do privilegio de suas atividades econômicas para reagir e promover a revolução da independencia mantendo o arcaico para proteger os niveis de produção e de exportação alcançados durante a colônia, balanceando sua polarização pessoal e social para não voltar a ser um aristocrata agrário (relacionado à estrutura de dominio das relações de dominação patrimonialista) nem evoluir apenas para um burgues agrário (posição de comerciante do excedente);